Ovo faz mal! Não pode comer glúten! Fuja do leite! A área da nutrição vira e mexe se rende a modas ou exageros que, no fim das contas, só prejudicam a busca por uma alimentação saudável. Mas chega de radicalismo!
SAÚDE caçou sete mitos pra lá de disseminados e os quebrou um por um. Mas, antes de avançar, vale dar um aviso: há muitas outras armadilhas nesse sentido. E a regra de ouro para não cair nelas é segurar o ímpeto inicial e, a partir daí, buscar orientação de fontes confiáveis.
Sem mais delongas, vamos aos mitos que prejudicam a alimentação:
1) Leite faz mal
A moda do momento é destroçar esse alimento, culpando-o do crime de provocar doenças cardiovasculares e neurológicas. Não caia nessa.
Claro, quem é intolerante à lactose ou alérgico à proteína do leite deve tomar cuidado com ele e seus derivados. Mas a verdade é que as pesquisas científicas, em sua maioria, votam a favor da inclusão desse alimento na dieta da população em geral.
Para começar, um copo de leite oferece cerca de 250 miligramas de cálcio, um quarto do que você precisa para o dia todo. Seus competidores nem chegam perto dessa concentração. Em 100 gramas de brócolis cozido, há 46 miligramas.
Isso ganha importância quando descobrimos que os brasileiros ingerem pouco desse nutriente por dia (por volta de 400 miligramas, quando deveriam consumir mil). O déficit de cálcio é associado à osteoporose, uma doença que favorece fraturas perigosas.
Como se fosse pouco, o leite possui proteínas, fósforo e gorduras saudáveis. Já existem indícios de que o integral, que domina 70% do mercado brasileiro, auxilia a afugentar males cardiovasculares. Em experimento da Universidade Tufts, nos Estados Unidos, fãs dessa versão eram menos propensos a encarar o diabetes tipo 2.
Agora, para quem já tem a doença, aí vale repensar o teor de gordura da dieta como um todo. Ainda assim, não há razão para abolir o leite. Gente acima do peso ou que já possui uma dieta gordurosa pode considerar e versão semidesnatada, por exemplo.
Convém ainda falar de uma acusação que pairava sobre o leite: a de que ele causa câncer por causa dos hormônios da vaca que passam para a bebida. Sim, essas substâncias de fato chegam ao líquido branco. Mas levantamentos mostraram que elas não são absorvidas no nosso organismo. Tanto que o Fundo Mundial de Pesquisa em Câncer conclui que a conexão entre o leite e essa doença é limitada.
Se por motivos filosóficos você não deseja beber leite, tem todo direito. Só não vale confundir as bolas entre ideologia e saúde.
2) Aquecer o azeite faz com que ele se torne prejudicial
Tem quem fale que, em altas temperaturas, as gorduras benéficas do azeite se convertem em substâncias perigosas. Mas – ainda bem! – isso não acontece nas nossas cozinhas, segundo trabalhos da Universidade Estadual de Campinas, no interior de São Paulo.
É que, para os compostos do azeite se converterem para o lado negro da força, eles precisariam ser submetidos a um calor muito intenso, e por um tempo prolongado, o que não ocorre durante os preparos caseiros.
Por outro lado, durante processos como a fritura, parte dos antioxidantes do azeite se perde. Contudo, vale ressaltar que também não é tanto assim. Uma revisão feita pela Associação Brasileira de revelou que não mais do que 20% dos antioxidantes presentes nesse óleo se perdem quando ele é submetidos a altas temperaturas.
Ou seja, dá para colocá-lo na panela e, ainda assim, aproveitar boa parte de seus benefícios à saúde. Aí é uma questão de ver se vale a pena para o bolso tomar essa atitude – ou se é melhor reservar a nobreza do azeite para o final dos preparos ou para a salada.
3) Comer ovo faz o colesterol disparar
O ovo fornece, sim, colesterol – a maioria está concentrada na gema. Mas, hoje, sabemos que só um terço do colesterol ingerido pela comida é, de fato, absorvido pelo organismo. E, pra melhorar, o alimento em questão contém substâncias que bloqueiam a chegada dessa partícula no sangue.
Já há inclusive estudos sugerindo que incluir o ovo no dia a dia elevaria até um pouquinho do HDL, apelidado de colesterol bom. Ou seja, ele seria benéfico para o coração, uma vez que reforçaria a presença dessa fração que trabalha pela limpeza dos vasos.
Em resumo, não é preciso abrir mão dessa delícia para ficar com as taxas em dia. Mas, se o seu colesterol está lá nas alturas, pergunte ao profissional de saúde quantas unidades comer por semana. Ele vai considerar todos os fatores de risco cardiovascular antes de indicar a porção segura – bem como outros elementos da dieta.
4) Cozinhar os alimentos sempre reduz seu teor de nutrientes
Verdade que, de modo geral, o calor afeta a concentração de fibras e certas vitaminas nos vegetais. Mas tenha em mente que o cozimento é indispensável para que nosso corpo consiga absorver outras substâncias importantes à saúde.
Alguns antioxidantes, como o licopeno e o betacaroteno, ficam mais biodisponíveis quando passam pelo processo de cocção. E exemplos não faltam.
O tomate, para citar um, é repleto do tal licopeno – que ajuda a afastar o câncer, diga-se de passagem. Mas, cru, só 13% dessa substância fica disponível. Já no molho, o índice vai para 70%. Abóbora e cenoura, dois redutos de betacaroteno, seguem a mesma linha.
Há ainda casos em que a versão crua de um alimento atrapalha a absorção dos nutrientes de seus companheiros. E aqui citamos o espinafre. Sem passar pelo fogo, ele solta uma boa dose de oxalato no prato, molécula que barra a entrada de certas substâncias benéficas no organismo.
Mas atenção: como já dissemos, não dá pra negar que principalmente frutas e folhas e hortaliças verdes são mais nutritivas quando ingeridas do jeito que vêm ao mundo. A principal perda com o cozimento é a das fibras, que amolecem com o calor.
O jeito é intercalar os preparos. Até porque aí o cardápio fica bem mais saboroso.
5) Néctar, refresco e suco são a mesma coisa
Não são nem de perto! O suco mesmo é feito 100% de fruta e não tem adição de açúcar artificial, mesmo que esteja dentro da caixinha. Como eles nada mais são do que o sumo de laranja, abacaxi, tangerina ou companhia, de fato vão concentrar mais calorias e menos fibras do que a fruta in natura.
Contudo, dentro de uma alimentação equilibrada, são considerados saudáveis por ofertarem vitaminas e minerais. E não precisam ser banidos por quem deseja emagrecer.
O néctar é outra história. Ele possui de 30 a 50% da polpa da fruta. E o resto? Água, saborizantes, corante… e muito açúcar adicionado. Pra ter ideia, tem néctar mais adocicado que refrigerante. Pare de olhar para as calorias do rótulo e foque nos ingredientes que você mesmo vai ver.
O refresco, então, nem se fala. Ele tem menos polpa que o néctar e mais açúcar – sendo bem sincero, sua contribuição para a nutrição do corpo é praticamente nula.
Uma dica no mercado: suspeite das palavras “néctar” e “refresco” e valorize o termo “integral”.
6) Trocar sal comum pelo gourmet baixa a pressão
Profissionais do Centro de Pesquisa em Alimentos (FoRC) revisaram trabalhos sobre sal rosa e companhia para descobrir se a diferença deles para a versão comum vai além do sabor. E os resultados decepcionaram.
Apesar do senso comum dizer o contrário, a presença de sódio nas versões gourmet é praticamente idêntica à do sal normal. E é esse o nutriente que, em excesso, faz a pressão disparar, aumentando o risco de hipertensão. Ou seja, não importa o tipo, maneire nas pitadas.
E mais: nesse mesmo trabalho da FoRC, notou-se que a presença de substâncias benéficas nos diferentes tipos de sal gourmet está longe de ser considerável. Sim, eles têm mais minerais, porque não passam pelo refinamento. Só que em hipótese alguma podem ser considerados fontes desses micronutrientes.
Vamos exemplificar com o sal rosa: dá mesmo para afirmar que ele possui quatro vezes mais cálcio do que o refinado. Mas, no fim das contas, os dois tipos oferecem poucas doses do mineral. Veja: 5 gramas do tempero gourmet (o indicado para um dia todo) concentram 8 miligramas de cálcio, sendo que a recomendação é consumir 1 000 miligramas do nutriente diariamente. Ou seja, é um baita exagero defender que esses sais ajudariam na prevenção da osteoporose, como se ouve por aí.
7) Cortar o glúten do dia a dia traz vantagens
O número de adeptos do regime glúten-free triplicou de 2009 para cá, de acordo com uma pesquisa da Escola Médica Rutgers New Jersey, nos Estados Unidos. Em boa parte, a moda ganhou força após celebridades anunciarem que pararam de ingerir a proteína do trigo, da cevada e do centeio, principalmente para emagrecer (mas também sob a alegação de ganhar saúde).
Porém, passados anos do início dessa febre, começam a pintar evidências de que eliminar pães e bolos sem motivo aparente ou orientação médica não é lá uma boa ideia. Pelo contrário.
Um indicativo contundente do revés vem da americana Universidade Harvard. Foram analisadas informações de quase 200 mil indivíduos, acompanhados durante três décadas. Aqueles que consumiam pouco (ou nenhum) glúten por dia apresentavam um maior risco de desenvolver diabetes tipo 2.
Já outros artigos atestam a segurança dos produtos com glúten. Um vindo da Universidade Colúmbia, também nos Estados Unidos, não encontrou relação entre a ingestão da proteína e o aumento nas taxas de infarto e AVC.
Aliás, o consumo moderado de suas fontes estava ligado a uma menor probabilidade de encarar esses males. E não é que o glúten esteja por trás dos benefícios – possivelmente, os alimentos que o contém não raro são ricos em grãos integrais, que oferecem proteção cardiovascular.
Além disso, trigo, centeio e cevada carregam vitaminas e fibras, estas essenciais para manter o equilíbrio da microbiota, o conjunto de bactérias que vivem em nosso sistema digestivo. Em resumo, elas servem de alimento para esses micro-organismos e impedem a absorção excessiva de gorduras e açúcares
Um adendo preocupante envolve o fato de que mercadorias sem glúten podem ser mais calóricas. A constatação veio do Instituto de Investigação Sanitária La Fe, na Espanha, que vasculhou 1 300 rótulos. Explica-se: a falta da proteína afeta a maciez e a elasticidade das massas. Daí, para compensar e acertar o ponto da receita, os fabricantes adicionam gordura.
Mas como os famosos emagreciam, então? Ao excluir fontes de glúten, faziam uma restrição severa de carboidratos, nossa principal fonte de calorias.
Ainda assim, temos de ressaltar a importância das dietas sem glúten para pessoas com doença celíaca ou sensibilidade não celíaca. Nesses quadros, retirar essa proteína do cardápio realmente melhora muito a vida das pessoas – e é ótimo termos cada vez mais opções assim no mercado. O que não dá é abolir esse nutriente sem necessidade ou recomendação do doutor.