“Os cachorros têm um lugar especial no meu coração”, afirma Matt Kaeberlein, biólogo e biogerontologista estadunidense que coordena as atividade do Dog Aging Project, o maior grupo de estudos sobre longevidade canina do mundo.
Em atividade há 10 anos, o projeto já beneficiou mais de 50 mil cães nos Estados Unidos e, por isso, virou inspiração para a mais nova iniciativa brasileira voltada a melhorar o envelhecimento de cães.
Trata-se do Programa Avançado de Mitigação do Envelhecimento Canino (Pamec), um projeto liderado pela biotech brasileira PetMoreTime que estará sob a orientação de Kaeberlein.
A iniciativa estudará cães policiais, por meio de protocolos que associam o uso de medicamentos a um estilo de vida saudável.
Clique aqui para entrar em nosso canal no WhatsAppEntre os principais destaques do projeto está a utilização da rapamicina. O fármaco, geralmente empregado como imunossupressor para prevenir a rejeição de órgãos transplantados em humanos, demonstrou aumentar em até 25% a expectativa de vida em ratos, segundo estudo publicado em julho na renomada revista Nature.
“A expectativa é que resultados semelhantes sejam vistos em outros mamíferos”, avalia Kaeberlein, cientista-chefe e cofundador do Pamec. “O Dog Aging Project está fazendo estudos para avaliar se a rapamicina pode aumentar a expectativa de vida dos cães e agora teremos também esse projeto no Brasil.”
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Como a rapamicina age no corpo
Naturalmente produzida pela bactéria Streptomyces hygroscopicus, a rapamicina foi isolada pela primeira vez na década de 1970. Desde então, tem sido estudada por sua ação imunossupressora e pelo potencial de retardar o envelhecimento celular.
Uma das suas vias de ação é a inibição de moléculas associadas a processos inflamatórios e à senescência. O composto ajuda a preservar células saudáveis e a promover a eliminação de células defeituosas em mamíferos.
“Por isso, na medicina veterinária, ela tem sido estudada principalmente na área de oncologia”, exemplifica Kaeberlein. “Também há estudos nos quais a rapamicina reverteu doenças cardíacas em gatos e ratos.”
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Essas aplicações, porém, ainda são experimentais e não foram aprovadas por órgãos regulatórios como a Food and Drug Administration (FDA), nos Estados Unidos, e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Iniciativas como a Pamec carregam uma grande expectativa em relação a como os resultados poderão contribuir para um melhor uso e entendimento desse composto, hoje utilizado com segurança por pacientes humanos transplantados e oncológicos.
Estudando cães policiais
No Brasil, cães policiais de ao menos 11 estados devem participar do programa. Serão selecionados animais que, entre outros critérios, estejam em bom estado de saúde e que tenham entre 7 a 8 anos, ou seja, que estejam no início da velhice canina.
“São animais que estão passando pelo início do declínio cognitivo e físico naturais da idade e que continuam (ou não) a fazer atividades com um alto grau de complexidade e exigência”, define o biólogo americano.
Uma vantagem de estudar especificamente os animais que trabalham para a Polícia Militar é a uniformidade dessa população, em que prevalecem animais de grande porte, acostumados a interação humana e submetidos a rotinas similares em termos de atividade e alimentação.
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“São também animais que precisam de uma atenção maior pela própria natureza do trabalho deles”, acrescenta Marcello Rachlyn, CEO da PetMoreTime, empresa brasileira de biotecnologia especializada na ciência da longevidade canina que lidera o projeto.
Para avaliar o sucesso do protocolo de tratamento, os pesquisadores observarão a resposta do animal ao estresse, a regulação do crescimento e da regeneração de tecidos, a redução do aparecimento de doenças crônicas e a expressão de genes responsáveis por proteger e reparar células ao longo da vida.
A rapamicina não será o único medicamento utilizado no protocolo do estudo.
Também farão parte senolíticos, isto é, drogas que retardam o envelhecimento ao eliminar células senescentes — aquelas que foram danificadas pelo avanço da idade e estão associadas a um maior risco de inflamações e doenças ligadas à velhice, como as cardiovasculares e os cânceres.
Envelhecimento saudável para os pets
“O desejo de qualquer tutor é que seu animal de companhia viva o máximo possível, e nós estamos trabalhando para encontrar formas baseadas em evidências científicas para, não apenas prolongar, mas também promover uma melhor qualidade de vida a esses bichos“, afirma Marcello Rachlyn.
Enquanto protocolos para estender a vida ainda estão em testes, a promoção de um estilo de vida saudável já melhora a qualidade de vida deles. Ele inclui alimentação variada, bastante hidratação, brincadeiras e truques que estimulem a capacidade cognitiva e física deles.
“Um ponto para se prestar atenção é o sobrepeso e a obesidade, que, assim como entre nós, é uma epidemia crescente nos pets e está associada a uma série de comorbidades”, pontua Kaeberlein.
Visitas regulares ao veterinário podem ajudar a flagrar problemas precocemente e prolongar a vida do bichinho.