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Vacina da dengue do Instituto Butantan: o que sabemos sobre o imunizante

Em estudo de fase 3, a vacina chamada Butantan-DV mostrou eficácia de 79,6% contra dengue, com uma única dose. E essa não é a única vantagem dela

Por Lucas Rocha
9 fev 2024, 15h50
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  • Por muito tempo, a ideia de uma vacina contra a dengue parecia um sonho distante. O cenário começou a mudar nos últimos anos, com a chegada dos imunizantes Dengvaxia, da empresa Sanofi-Aventis Farmacêutica, e, principalmente, com a Qdenga, do laboratório japonês Takeda, que está disponível no SUS para grupos específicos.

    Agora, uma inovação brasileira se encaminha para a reta final dos estudos clínicos. O Instituto Butantan lidera o desenvolvimento de uma vacina contra a dengue que poderá chegar aos braços dos brasileiros em 2025.

    Chamado Butantan-DV, o imunizante é tetravalente, ou seja, composto pelos quatro sorotipos do vírus (DENV-1, DENV-2, DENV-3 e DENV-4). Ele é produzido a partir da tecnologia de vírus atenuado – como a Qdenga -, que induz uma proteção robusta e duradoura tanto de anticorpos como de resposta celular.

    Ao todo, foram recrutadas mais de 16 mil pessoas, com idades entre 2 e 59 anos, para o ensaio clínico de fase 3, cujo recrutamento teve início em 2016. A análise, que acontece em 16 centros de pesquisa, segue em andamento e já apresenta resultados promissores.

    + Leia também: As particularidades do vírus da dengue

    Eficácia da vacina Butantan-DV contra a dengue

    No final de janeiro de 2024, o Instituto Butantan publicou os primeiros resultados obtidos a partir desse amplo estudo clínico no prestigiado periódico científico The New England Journal of Medicine (NEJM). A candidata a vacina apresentou uma eficácia de 79,6% com a aplicação de uma dose única.

    Em um período de dois anos, o imunizante mostrou proteção independentemente se o voluntário já tinha sido infectado pelo vírus da dengue ou não.

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    O estudo incluiu 16 235 participantes, dos quais pouco mais de 10 mil receberam a candidata a vacina do Butantan e o restante placebo. “Monitoramos todos os sintomas e fazemos testes para ver se é dengue ou não. A partir disso, sabemos que o grupo placebo apresentou 80% mais casos de dengue que o grupo vacinado. Por isso, a eficácia e proteção é de quase 80%”, detalha Fernanda Boulos, diretora-médica do Butantan.

    A ampla resposta imune foi observada em todas as faixas etárias avaliadas. Os índices foram de 90% em adultos de 18 a 59 anos, de 77,8% dos participantes de 7 aos 17 e de 80,1% nas crianças de 2 a 6 anos.

    No que diz respeito aos diferentes sorotipos do vírus, foram avaliadas até o momento a eficácia para os tipos DENV-1 (89,5%) e DENV-2 (69,6%), que foram os únicos em circulação no país no período do estudo.

    “Como todas as vacinas, a proposta é apresentar algo ao organismo que seja seguro, mas que faça ele criar uma resposta imunológica contra o agente infeccioso”, explica o infectologista pediátrico Marcelo Otsuka, vice-presidente do Departamento de Infectologia da Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP).

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    Aplicação da vacina da dengue do Butantan no Brasil vai depender de aprovação da Anvisa (Foto: Renato Rodrigues/Comunicação Butantan/Divulgação)

    Dose única

    A vacina do Butantan mostrou forte capacidade de proteção com a aplicação de apenas uma dose, diferentemente dos dois imunizantes contra a dengue já autorizados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que contam com esquemas de duas a três aplicações.

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    “A grande fortaleza dessa vacina, além da eficácia alta, da segurança e de ser brasileira, é ser em dose única, que mostra resultados semelhantes às duas doses da vacina japonesa”, diz Renato Kfouri, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm). “Isso traz uma grande vantagem operacional: com o mesmo quantitativo de doses, vacina-se o dobro de pessoas”, arremata.

    Diante de uma aprovação para uso no país, a Butantan-DV pode facilitar a adesão da população, a logística das campanhas, além de baratear os custos ao sistema de saúde.

    Leia também: Dengue: podemos estar perto de uma nova epidemia em 2024

    Outra vantagem é que o imunizante brasileiro pode ser aplicado tanto em pessoas que já tiveram dengue como em quem nunca foi infectado pelo vírus. O perfil é diferente da Dengvaxia, que só pode injetada em pessoas que já tiveram a doença. Cabe destacar que a Qdenga também traz essa virtude da Butantan-DV.

    “Com o dado que temos hoje, não esperamos ter restrição em relação à exposição prévia ao vírus da dengue”, salienta Fernanda.

    Segundo o instituto, a Butantan-DV teve o mesmo perfil de segurança para os dois grupos. Em pessoas que já apresentavam anticorpos para a dengue antes do estudo, por exemplo, foi registrada uma proteção de 89,2%. Já entre aqueles que nunca tiveram contato com o vírus, a eficácia foi de 73,6%.

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    + Leia também: Vacina Qdenga: quem pode tomar e outras respostas sobre o imunizante que chega ao SUS

    Quando teremos a vacina da dengue do Butantan?

    A aplicação de vacinas no Brasil depende de aprovação da Anvisa – um processo que ganhou notoriedade durante a pandemia de Covid-19.

    A expectativa é de que os dados de eficácia do ensaio clínico mencionados anteriormente sejam encaminhados à agência no segundo semestre de 2024.

    Com vistas a acelerar o processo de avaliação, será adotado o procedimento de submissão contínua para avaliar o dossiê com os dados da Butantan-DV. Criado pela Anvisa durante a pandemia, o modelo permite que o laboratório apresente os documentos do imunizante em etapas, conforme a pesquisa vai avançando.

    “Esperamos, após a aprovação da Anvisa, ter no ano que vem a vacina disponível para a população”, estima Fernanda.

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    Desenvolvimento da vacina da dengue do Butantan chega à reta final (Foto: Renato Rodrigues/Comunicação Butantan/Divulgação)

    Uma vacina brasileira

    A idealização de um imunizante nacional contra a dengue é de longa data. Em 2009, o Butantan obteve o licenciamento para a tecnologia utilizada nessa vacina via os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH, em inglês). Na ocasião, foram cedidas as patentes e os materiais biológicos das quatro cepas do vírus.

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    De acordo com a diretora-médica do Butantan, a licença permite que o imunizante seja produzido e distribuído no Brasil. “As cepas foram importadas do NIH e os desenvolvimentos clínico e de produto da vacina foram feitos inteiramente no Butantan”, destaca. “Temos outras empresas que também licenciaram esses mesmos antígenos do NIH, produzem suas próprias vacinas e têm licenças que permitem a venda para outras regiões do mundo”, complementa.

    Em 2018, por exemplo, o Butantan assinou um acordo com a farmacêutica MSD, que atua na formulação de uma vacina análoga, para acelerar o desenvolvimento de estudos.

    Questionada sobre a possibilidade de futura exportação da vacina, a pesquisadora adiantou: “O Brasil é uma região que será coberta pelo Butantan. Estamos discutindo e negociando com outros times a possibilidade de disponibilizar o imunizante para a América Latina ou via Organização Pan-Americana da Saúde, são questões ainda em aberto.”

    Vacinação contra a dengue em 2024

    A distribuição da vacina Qdenga pelo Ministério da Saúde começou no dia 8 de fevereiro, para municípios previamente definidos.

    O público-alvo da campanha são crianças e adolescentes de 10 a 14 anos. No entanto, a imunização começa pelo grupo de 10 e 11 anos de idade, até que sejam entregues novos lotes ao país, de acordo com orientação da pasta.

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    Considerando que a vacina do Butantan não será utilizada para reduzir os impactos da doença neste ano, a palavra-chave é prevenção. Nesse contexto, vale reforçar as medidas para evitar a proliferação do Aedes aegypti, velho conhecido dos brasileiros.

    “Nenhuma das vacinas traz 100% de proteção. Então, existe a necessidade eterna de cuidados com a disseminação dos vírus”, diz Otsuka.

    Vale destacar que não precisa muito: uma única vistoria semanal do ambiente doméstico em busca de potenciais criadouros é suficiente para quebrar o ciclo de reprodução do mosquito, que dura de sete a dez dias.

    Eliminar a água parada é essencial para impedir que o Aedes saia voando por aí e espalhe, além da dengue, o zika e chikungunya. Aqui estão alguns pontos de atenção:

    Para ajudar na ronda, conte com o material desenvolvido por cientistas do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), disponível online.

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