A partir de 2024, o Ministério da Saúde começa a substituição gradual das vacinas contra a poliomielite aplicadas gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
A conhecida vacina oral, que inspirou o personagem Zé Gotinha, será substituída pela versão injetável do imunizante. Hoje as duas são usadas em um esquema combinado.
Em anúncio realizado nesta sexta-feira, 7, a pasta destaca que a decisão segue uma recomendação da Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização (CTAI) e representa um avanço tecnológico.
A atualização considerou critérios epidemiológicos, evidências científicas e recomendações internacionais sobre o tema. No entanto, a versão oral permanece eficaz na prevenção da doença e ainda continuará em uso nos postos de saúde até o final da transição.
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A forma injetável, vacina inativada poliomielite (VIP) ou Salk, já é aplicada no país em crianças, aos 2, 4 e 6 meses de vida. Seguindo a indicação dos especialistas, ela também será usada no reforço aos 15 meses de idade, atualmente feito com a forma oral.
De acordo com o ministério, a dose de reforço aplicada atualmente aos 4 anos não será mais necessária, considerando que o esquema vacinal com quatro doses já garante a proteção contra a pólio, segundo as evidências disponíveis.
O período de transição começa no primeiro semestre de 2024.
Entenda a mudança
A vacina poliomielite oral atenuada (VOP), conhecida como vacina Sabin, teve um papel fundamental na diminuição da circulação do poliovírus em todo o mundo. Graças à vacinação, os casos de poliomielite pelo vírus selvagem diminuíram mais de 99,9% nos últimos anos.
A Região das Américas, que investiu pesado nas campanhas de imunização, foi a primeira região do mundo a obter o Certificado de Erradicação da Poliomielite provocada pelo vírus selvagem. Mas não estamos sozinhos.
“Ainda temos países onde a pólio por vírus selvagem é endêmica e vários locais do mundo apresentam a circulação de poliovírus derivado da vacina oral atenuada, favorecendo o aparecimento de novos casos de pólio”, explica a epidemiologista Carla Domingues, ex-coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI).
Nesta situação, o vírus atenuado que existe na dose da gotinha sofre mutações no ambiente e pode causar poliomielite. É uma situação considerada muito rara, e que costuma ocorrer em locais com baixa cobertura vacinal, onde pessoas não tem nenhuma imunidade prévia contra o patógeno.
No Brasil, a injetável é aplicada antes da gotinha justamente para diminuir esse risco. Mesmo assim, a possibilidade existe.
Por esta razão, a Organização Mundial da Saúde recomenda que os países adotem exclusivamente a versão injetável. “Para que a meta de erradicação sugerida pela entidade seja atingida, esta migração terá que acontecer de forma global”, pontua Carla.
De Zé Gotinha para “Zé Injeção”
O Brasil fez a primeira mudança em 2012, quando substituiu as duas primeiras doses pela injetável e as demais continuaram a ser feita com a vacina oral.
Em 2016, o esquema primário (com as doses aos dois, quatro e seis meses) passou a ser feito com a VIP e os reforços, aos 15 meses e 4 anos de idade com a gotinha.
“É fundamental buscar o desenvolvimento de estratégias para manter a doença erradicada no país. Agora é hora de passar a ser utilizar somente a VIP, em todas as doses recomendadas no calendário infantil”, diz a epidemiologista.
Cobertura vacinal
Carla ressalta que é essencial que todos os municípios atinjam elevadas coberturas vacinais, com índices de 95% ou mais. E isso envolve tomar a vacina oral dentro do esquema recomendado, enquanto a migração não acontece.
“Só desta forma nossas crianças continuarão livres desta doença que já ceifou a vida de milhares de crianças no passado, além de deixá-las com sequelas irreversíveis, como a paralisia infantil”, destaca.
O Brasil não tem notificação de caso de poliomielite desde 1989. Entretanto, a taxa de imunização contra a doença no país ficou em 77,19% no ano passado, bem abaixo da meta de 95%.
A ampliação de coberturas vacinais no país foi anunciada como uma das prioridades da pasta chefiada por Nísia Trindade no início do ano. A medida tem como objetivo reduzir os riscos de reintrodução de doenças perigosas já eliminadas do território nacional.
Estão previstas ações com estados e municípios, como aplicação nas escolas, busca ativas por indivíduos que não foram vacinados, checagem e atualização da caderneta sempre que a família for ao posto.