Dia das Mães: Assine a partir de 10,99/mês

Reforço da vacina da covid-19 é importante, mas desigualdades preocupam

Idosos e imunossuprimidos se beneficiam de dose extra, mas muitos países não têm nem 10% da população imunizada, o que afeta controle da pandemia

Por Ingrid Luisa
Atualizado em 15 set 2021, 11h08 - Publicado em 14 set 2021, 19h00
dose de reforço da vacina
Terceira dose é recomendada para idosos e imunossuprimidos. (Foto: CDC/Unsplash/Divulgação)
Continua após publicidade

Em 25 de agosto, o Ministério da Saúde anunciou uma recomendação para que idosos acima de 70 anos e pessoas imunossuprimidas tomem a terceira dose da vacina contra a covid-19. Segundo a pasta, o reforço deve ser feito preferencialmente com o imunizante da Pfizer – na falta dele, o ideal é utilizar as vacinas da Astrazeneca ou Janssen.

A data oficial para o início da medida era a segunda semana de setembro, mas estados como São Paulo já se adiantaram. O governo paulista, aliás, incluiu a Coronavac como alternativa, decisão que vem causando discordância entre especialistas e fez algumas cidades suspenderem a aplicação enquanto o impasse se resolve.

A atualização constante da campanha de imunização gera dúvidas. Sabe-se que é seguro aplicar uma terceira dose, e que ela pode ser bem-vinda para proteger pessoas mais vulneráveis. Contudo, especialistas e autoridades mundiais em saúde pública questionam o efeito da medida no controle da pandemia pelo mundo — especialmente a aplicação para a população em geral.

Um estudo publicado no periódico The Lancet, assinado por pesquisadores da Universidade Oxford, da Organização Mundial de Saúde (OMS) e outras entidades, aponta que todas as vacinas contra covid-19 sendo usadas hoje em larga escala mantêm sua eficácia contra casos graves e mortes em níveis aceitáveis, inclusive meses depois da aplicação.

No artigo, os autores afirmam que o reforço pode ser apropriado em pessoas com a imunidade comprometida. O texto deixa claro ainda que, para superarmos o coronavírus, é melhor focar esforços em quem não está vacinado.

+ Leia também: Por que é importante tomar a segunda dose da vacina? 

Enquanto a discussão científica acontece, os países mais ricos já estão oferecendo o reforço. Israel começou a aplicá-lo em agosto, e mostrou bons resultados de proteção, segundo o governo local. Os israelenses chegaram a ampliar a medida para a população geral.

Além deles, Estados Unidos, Alemanha, Turquia, Chile, Uruguai e Rússia estão entre os países que já distribuem a terceira dose para grupos em maior risco, e diversos outros se planejam para seguir o mesmo caminho nos próximos meses.

Continua após a publicidade

O Brasil ainda avança em sua campanha de imunização e, em agosto, o Ministério da saúde apontou que cerca de 8 milhões de pessoas estavam com a segunda dose atrasada. Atualmente, muitos brasileiros esperam por sua vez de completar o esquema de imunização. Mas isso não um impeditivo para a implementação da dose extra.

“Desde que uma coisa não interfira na outra, o ideal é já aplicá-la” afirma Alexandre Naime, infectologista e professor da ​​Universidade Estadual Paulista (Unesp). “Temos uma alta cobertura de primeira dose no país, e muitas pessoas não ainda não completaram seus esquemas. Mas, como a grade de vacinação prevê que o reforço não vai interferir no estoque para a segunda dose, não há problema algum”, conclui.

Por que tomar a terceira dose

A rigor, a necessidade de aplicação de mais uma dose se baseia em três fatores: disseminação da variante delta, a queda de anticorpos neutralizantes após alguns meses e a fragilidade do sistema imunológico de grupos específicos.

A delta, variante mais transmissível que já predomina em estados como São Paulo e Rio de Janeiro, tem se mostrado mais resistente a anticorpos desenvolvidos em contatos anteriores com o Sars-CoV-2 e parece elevar o risco de infecções sintomáticas em vacinados.

+Leia também: Variante delta reforça a importância do uso correto de máscaras

Em julho, a revista Nature publicou uma pesquisa explorando esses aspectos. O trabalho indicou uma maior resistência da delta a anticorpos monoclonais, usados no tratamento contra o coronavírus, assim como a anticorpos neutralizantes de pacientes previamente infectados.

Continua após a publicidade

A conclusão do estudo, porém, é de que duas doses de vacina seguem eficazes contra a variante. “Mas isso pode implicar em diminuição de proteção, especialmente em imunizantes que já apresentem uma efetividade limítrofe, como a Coronavac”, pondera Júlio Croda, infectologista e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz, que notou a perda de efetividade da vacina do Butantan em idosos com mais de 80 anos.

Em relação a queda de anticorpos depois de um tempo, isso acontece mesmo, e, de acordo com o infectologista, em todas as idades.

Só que, como o estudo publicado no The Lancet explica, a diminuição no nível de anticorpos neutralizantes não prediz necessariamente a queda da eficácia da vacina com o tempo. “Do mesmo modo, a redução de proteção contra casos moderados da doença não indica que a proteção contra casos graves será afetada”, escrevem os autores.

“Estudos mostram uma negativação dos anticorpos neutralizantes em pessoas que tomaram a Coronavac após seis meses. Isso pode estar associado a uma queda da capacidade de proteção, mas não significa que a vacina perdeu efetividade. Ainda precisamos entender, com mais estudos, se essa diminuição afeta casos leves, graves ou até óbitos”, completa Croda.

Mesmo com a queda de anticorpos, acredita-se que os imunizantes mantenham a efetividade por uma característica básica deles: a construção de memória imunológica. Diversos estudos apontam que todas as vacinas contra a covid-19 (Coronavac inclusa) são capazes de estimular o desenvolvimento dessa memória no organismo.

Continua após a publicidade

Ou seja, mesmo que você tenha poucos anticorpos ou o teste sorológico der negativo, seu corpo é capaz de produzi-los rapidamente ao entrar em contato com o vírus. É para isso, afinal, que as picadas servem.

Além disso, os dados de vida real mostram que as vacinas continuam funcionando bem, mesmo frente às variantes. Basta ver o Brasil, que segue registrando quedas nos óbitos e novos casos de covid-19 com o avanço da vacinação.

+Leia mais: Pegar Covid-19 depois da vacina não significa que o imunizante falhou

Idosos e pessoas imunossuprimidas

Até agora, o reforço parece útil apenas para os mais velhos e pessoas imunossuprimidas (com aids, transplantadas ou em tratamento de câncer, por exemplo). O principal problema do primeiro grupo é a imunossenescência, ou envelhecimento do sistema imunológico, que resulta em uma resposta menor às vacinas.

“Publicamos um artigo a respeito da Coronavac mostrando que, em idosos acima de 80 anos, ela oferece menos de 50% de proteção contra óbitos, então eles já deveriam tomar uma terceira dose por isso”, afirma o pesquisador da Fiocruz.

Segundo Alexandre Naime, idosos que foram vacinados há mais tempo começaram a apresentar maior risco de internação e óbito nos últimos meses.

Continua após a publicidade

Ele explica que na segunda onda da doença no Brasil, em abril e maio deste ano, houve, sim, um predomínio de jovens (que ainda não estavam vacinados) nos hospitais, mas, a partir de junho e julho, a terceira idade voltou a dominar enfermarias e UTIs.

“Isso mostrou que a imunidade, principalmente para esse grupo, é temporária. Por isso, estudos apontaram a necessidade de uma dose de reforço”, afirma.

E os imunossuprimidos não estão numa situação melhor. “Eles estão até mais suscetíveis que idosos: o nível de anticorpos neutralizantes deles cai muito. Por isso o Ministério da Saúde orienta que eles recebam a terceira dose 28 dias depois da segunda. Para os idosos, a recomendação é aguardar seis meses”, esclarece Alexandre.

Terceira dose para uns, nenhuma para outros

Para além das necessidades reais desses grupos, muito se discute sobre a disparidade mundial de distribuição de vacinas. É justo aplicar terceira dose em pessoas com a imunização já completa enquanto muitas outras não receberam nenhuma?

+Leia mais: Ann Lindstrand, da OMS: “Ninguém está seguro até todos estarmos seguros”

A Organização Mundial da Saúde (OMS) vem batendo nessa tecla desde do início de agosto e, no último dia 8, o diretor geral Tedros Adhanom Ghebreyesus pediu que os países ricos adiem o reforço para 2022, priorizando a doação de doses excedentes para nações mais pobres.

Continua após a publicidade

De acordo com a OMS, só 20% dos moradores dos países de renda baixa ou média tomaram a primeira dose da vacina. Nas nações mais ricas, a cobertura na primeira dose está nos 80%. O objetivo da organização é que pelo menos 40% da população de todos os países esteja vacinada até o fim do ano.

A cientista Sarah Gilbert, líder da equipe que desenvolveu a vacina Oxford/Astrazeneca, afirmou ao periódico Daily Telegraph que é a favor da dose de reforço para imunossuprimidos e idosos, mas que essa medida é emergencial, e não deve ser ampliada para outras faixas etárias.

“A imunidade [após duas doses] está durando bastante na maioria das pessoas, e precisamos levar vacinas para países onde poucas pessoas foram imunizadas até agora”, ponderou a pesquisadora. 

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
Apenas 5,99/mês
DIA DAS MÃES

Impressa + Digital

Receba Veja Saúde impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*
A partir de 10,99/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
Pagamento único anual de R$71,88, equivalente a R$ 5,99/mês.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.