Já falamos das subvariantes BA.1 e BA.2 do novo coronavírus, que surgiram a partir da Ômicron. Essa dança de multiplicação viral pelo mundo resultou em dois novos “bichinhos”, que unem partes de variantes diferentes: a Deltacron, da união entre Delta com a Ômicron e, mais recentemente, a XE, mistura de BA.1 e BA.2.
Elas são consideradas variantes recombinantes. Isto é, surgem a partir da co-infecção de dois subtipos do vírus em uma única pessoa. Dentro das células humanas, eles efetivam essa fusão.
Lembrando que o vírus só tem a oportunidade de criar uma mutação quando infecta o organismo de alguém. Quando ele entra nas células, usa as estruturas ali presentes para criar cópias de si mesmo. A cada cópia, pode ocorrer um erro no material genético, uma mutação.
Ao acumular vários erros e transmitir essas mutações às próximas cópias, surge uma variante. No caso da Deltacron e do XE, o que ocorreu foi uma combinação de dois tipos infectando as mesmas células.
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“A recombinante pode ser um salto evolutivo ou não. Enquanto uma variante comum é composta de pedacinhos de um vírus original, a recombinante faz uma junção de genomas inteiros. Mas não necessariamente isso resulta em um ganho tão grande para o vírus, até porque ele pode pegar características que, juntas, não dão tanta força a ele”, esclarece o virologista Fernando Spilki, professor da Universidade Feevale.
Não é uma exclusividade do coronavírus. Outros patógenos, como o HIV e o influenza, também têm essa capacidade.
O quanto esse vírus recombinante preocupa?
A Deltacron, primeira mutante recombinante, preocupou especialistas porque une a Delta, que provocava casos mais graves, com a Ômicron, mais transmissível. Mas, até agora, ela não ganhou terreno pelo mundo. Foram notificados apenas casos mais isolados.
Por outro lado, a XE tem uma conexão forte com a BA.2, que cresce exponencialmente na Europa e nos Estados Unidos. “Como a XE tem muito mais características da BA.2, que prevalece nesses lugares, é importante que essas regiões também fiquem alertas com a recombinante”, explica Bernardo Almeida, infectologista do infectologista e chefe médico da Hilab.
E por esse mesmo motivo, ela se mantém na lista de preocupação da Organização Mundial de Saúde (OMS). A agência de saúde britânica (UK Health Security Agency) divulgou o último relatório sobre a XE no fim de março. Ela foi descoberta no Reino Unido em janeiro e os casos da recombinante só sobem por lá desde então.
O documento informa que a preocupação deve vir de quem ainda não se vacinou, e que a nova variante não deve causar casos graves e hospitalizações em quem está protegido. Mas, claro, ser infectado nunca é boa ideia. Mesmo os casos leves têm sido notificados com a síndrome da pós-Covid.
Não há informações, ainda, sobre a mudança nos sintomas – que se mantém semelhantes aos da Ômicron: tosse, dor de garganta, coriza, febre, dor no corpo.
Já no Brasil, como prevaleceu a BA.1, em teoria, é menos provável que a XE ganhe espaço – mas, claro, nada no mundo dos vírus é certeza. Segundo dados da Rede Genômica da Fiocruz, essa cepa ainda está em evidência.
No mês de março, foram sequenciados geneticamente 436 testes de Covid-19, e apenas 0,3% eram da BA.2. Mais de 80% das amostras era da BA.1, e cerca de 17% não puderam ser identificadas.
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Como nos proteger?
O cuidado é o de sempre: usar máscaras, em especial em ambientes de alto risco, evitar aglomerações e higienizar constantemente as mãos. Além disso, é preciso testar e se isolar na presença de sintomas respiratórios.
Fazer sequenciamento dos exames positivos e acompanhar o número de casos ajuda a preparar o sistema de saúde para novas variantes. “A real preocupação vem quando a taxa de transmissão do vírus, o RT, passa de 1 ponto”, alerta Almeida. Se o número vai além disso significa que uma pessoa infectada pode transmitir o vírus a mais de uma.
O site Covid-19 Analytics, mantido por professores da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) aponta uma taxa de transmissão atual de 0,7 no Brasil. Na conta, 100 infectados contaminariam outras 70 pessoas, apontando tendência de redução da circulação do vírus.
A XE é levemente mais transmissível que os seus vírus de origem (cerca de 10%), mas não há informação de que ela seja capaz de escapar mais facilmente das vacinas. Para se manter protegido, só tomando as injeções no tempo correto. O problema é que o Brasil ainda engatinha para colocar a terceira dose em dia.