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O que é paralisia infantil e por que podemos voltar a conviver com ela

Poliomielite volta a ser detectada em 28 países que já tinham erradicado a doença. Baixa vacinação coloca as Américas (Brasil inclusive) na área de risco

Por Fabiana Schiavon
Atualizado em 27 jul 2022, 17h14 - Publicado em 11 abr 2022, 16h04
vacina paralisia infantil
O poliovirus pode afetar o sistema nervoso e causar paralisia permanente das pernas ou braços. Não existe nenhum tipo de medicamento que impeça a progressão da doença (Foto: National Cancer Institute/Unsplash/Divulgação)
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A poliomelite, que ficou conhecida no Brasil como paralisia infantil, caiu no esquecimento porque praticamente deixou de existir. Só que os baixos índices de vacinação estão fazendo a doença voltar a preocupar. Ela afeta mais as crianças e deixa como sequela a dificuldade de locomoção, daí o nome.

Os últimos casos no país foram registrados há 30 anos. A pólio foi considerada erradicada nas Américas ainda nos anos 1990, mas a região sofreu bastante com a doença no passado. Em 1975, antes da imunização em massa, cerca de 6 mil crianças americanas ficaram paralisadas por causa da infecção, segundo a OPAS.

O risco do retorno traz à tona lembranças tristes do passado. “Crianças utilizando muletas, cadeira de rodas, respirando com a ajuda de aparelhos. Essa era uma tragédia para a infância décadas atrás”, lembra Luiza Helena Falheiros Arlante, presidente da Câmara Técnica de Certificação de Erradicação da Poliomielite no Brasil junto à Organização Pan-americana de Saúde (OPAS/OMS).

Até agora, o continente segue livre de casos, mas 28 países que já haviam eliminado a doença assistiram seu retorno nos últimos anos. Sem um esforço global para erradicá-la, nenhuma região está segura, alertam especialistas.

No Brasil, o problema são as taxas de vacinação infantil, que atingiram quedas históricas e já preocupavam especialistas antes da pandemia do coronavírus. A meta é imunizar 95% das crianças, meta que sempre foi batida com tranquilidade, até a história começar a mudar. Em 2018, o índice já estava em 76,6%. No ano passado, foi de apenas 67%.

Números sobre a poliomielite:
+ 2 países são endêmicos (nunca erradicaram a doença): Afeganistão e Paquistão
+ Em fevereiro deste ano, o vírus selvagem tipo 1 viajou do Paquistão até o Malauí, país africano que havia notificado seu último caso em 1992
+ 28 países no mundo voltaram a ter casos anos após a erradicação: Israel, Tajiquistão, Ucrânia, Egito, Irã, Somália, Iêmen e mais 22 países africanos

Como a poliomielite é transmitida

A transmissão costuma ocorrer pela chamada via oral-fecal. Trata-se, em resumo, do contato da boca com resquícios invisíveis de cocô contaminado.

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Isso pode acontecer, por exemplo, através de água, objetos e alimentos. Além disso, as próprias fezes de alguém infectado representam um risco real de contágio. Ou seja, a condição sanitária de uma região faz toda a diferença.

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Existe ainda a possibilidade de um sujeito com poliomielite passar a doença por meio de gotículas de saliva. Sim, espirro, tosse e beijos ajudam a transmitir o poliovírus, que pode ficar alojado na região da orofaringe.

É importante ter bons hábitos de higiene para se livrar do vírus, mas há poucas formas de prevenção da poliomielite além da imunização. “Se uma pessoa viaja para cá com o vírus no seu intestino, não há teste que detecte a infecção no aeroporto, como fizemos na pandemia do coronavírus”, alerta Luiza.

+ Leia também: Os números não mentem: entenda a matemática das vacinas

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Outro motivo faz a vacinação ser ainda mais urgente. Há casos raríssimos em que uma pessoa imunizada pode desenvolver poliomielite pelo próprio vírus vacinal, que passa por mutações dentro do organismo e depois esse “mutante” é passado adiante. Por outro lado, quanto mais gente vacinada, menor o risco dele se multiplicar por aí.

Por isso o esforço é mundial. “A doença passou a ser vista como algo que está muito distante de nós, até que países mais desenvolvidos como Israel passaram a confirmar casos e ela passou a ser notícia”, avalia Isabella Ballalai, vice-presidente da Sociedade brasileira de Imunizações (SBIm).

+Leia também: Quais são os sintomas da poliomielite, que voltou às Américas após 30 anos

A vacina e quem deve tomar

A imunização contra a poliomielite deve ser iniciada aos dois meses de vida, com mais duas doses aos 4 e 6 meses. Logo após, vêm os reforços, entre 15 e 18 meses e aos 5 anos.

Há dois tipos: a Vacina Inativada Poliomielite (VIP), injetável, e a Vacina Oral Poliomielite (VOP), a famosa gotinha.

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“O esquema utilizado no Brasil é bastante seguro, porque iniciamos com as doses da vacina inativa, e só os reforços são de via oral, com o vírus vivo. Ela incrementa a imunidade sem oferecer riscos”, esclarece Ribeiro.

Os pais que não vacinaram as crianças nessas idades citadas devem procurar o posto de saúde e colocar a imunização em dia. “A pólio também afeta adultos, ela só ficou conhecida por paralisia infantil porque as crianças eram as mais vulneráveis”, lembra Ribeiro.

sintomas da paralisia infantil
O personagem Zé Gotinha, conhecido no Brasil, remete à vacinação contra a poliomielite ( Ilustração: Ministério da Saúde/Divulgação)

A gravidade da poliomielite

A infecção, provocada pelo poliovírus, acomete principalmente crianças com menos de 4 anos de idade, embora também possa atingir adultos. Na maioria das vezes, os sintomas são considerados leves: febre, dor de garganta, náusea, vômito, constipação e dor abdominal estão entre eles.

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Ocorre que 1% dos infectados desenvolvem a forma paralítica da doença. Nesses casos, o vírus ataca estruturas do sistema nervoso ao longo do corpo todo, em geral as responsáveis pelos membros inferiores. Com isso, uma das consequências é a perda de movimento de uma das pernas.

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Entretanto, é possível que esse ataque aos nervos afete músculos que fazem os pulmões trabalharem – aí o paciente desenvolve uma insuficiência respiratória, que exige o uso de máquinas para garantir o entra e sai de ar. Segundo a OMS, duas a dez em cada 100 crianças com poliomielite morrem pela insuficiência respiratória.

Não existe nenhum tipo de medicamento que impeça a progressão desse estado.

Há casos de pessoas que se recuperaram, mas tiveram, mais tarde, a síndrome pós-pólio, entre 15 e 40 anos depois da fase aguda, com fraqueza e episódios de paralisia.

O que nos levou ao risco?

Faltam campanhas

A principal crítica de médicos e associações é o baixo investimento em campanhas de vacinação. O velho ‘Zé Gotinha’ virou quase um desconhecido.

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“Há anos, ele chegava de barco onde fosse preciso, andava de helicóptero, eram investidos milhões na imunização. Hoje, nem cartazes são vistos nos postos”, o pediatra e epidemiologista José Geraldo Leite Ribeiro, consultor em vacinas do Grupo Pardini.

Horário de funcionamento dos postos e falta de lotes

Atualmente, com ambos os pais trabalhando ao longo do dia, é mais difícil levar uma criança para se vacinar em horário comercial. O pedido de especialistas é que as salas de vacinação funcionem também aos sábados.

Alguns estados ainda sofrem com falta de lote. “Nem toda região tem boa disponibilidade de vacinas. O responsável até leva a criança no posto, mas não encontra a dose, e depois da segunda tentativa, eles desistem”, alerta Luiza, da Opas.

Baixa vigilância epidemiológica

Qualquer unidade de saúde deve notificar o Ministério da Saúde qualquer caso de paralisia flácida aguda, que pode ser um caso de poliomielite.

“Estamos sempre abaixo do número de análises recomendadas pela OMS. Há divulgação de notas de alerta aos profissionais de saúde, mas elas não chegam para todo o mundo”, lamenta Isabela.

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