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Novos dados sobre impacto da Covid no pulmão dão pistas para tratamento

Pesquisa realizada por consórcio de cientistas de diversas universidades brasileiras levantam possibilidade de testar novas drogas contra a doença

Por Luciana Constantino, da Agência Fapesp*
Atualizado em 29 abr 2022, 18h00 - Publicado em 29 abr 2022, 17h57
covid tratamento
O grupo de cientistas desvendou um mecanismo de desregulação das metaloproteinases, que pode estar associado à formação de fibrose no órgão, deixando sequelas nos pacientes  (Ilustração: Lucas Kazakevicius/SAÚDE é Vital)
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Pesquisadores brasileiros descobriram um mecanismo ligado ao agravamento da Covid-19 nos pulmões, abrindo uma nova possibilidade para tratamento.

Estudo publicado na revista científica Biomolecules mostrou, pela primeira vez, que a atividade enzimática e a expressão de dois tipos de metaloproteinase, MMP-2 e MMP-8, aumentaram significativamente nos pulmões de pacientes graves infectados pelo Sars-Cov-2.

Essa espécie de “tempestade de enzimas” ajuda no processo de inflamação exacerbada do pulmão, que acaba alterando as funções do órgão.

Normalmente, as metaloproteinases (grupo de enzimas que participam do processo de degradação de proteínas) são importantes na cicatrização e no remodelamento do tecido, mas, com a produção excessiva, é como se elas atuassem para lesionar o pulmão.

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Outros estudos já haviam comprovado que a resposta hiperinflamatória à Covid-19 é caracterizada pela “tempestade” de citocinas, levando à síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA).

Agora, o grupo de cientistas desvendou um mecanismo de desregulação das metaloproteinases, que pode estar associado à formação de fibrose no órgão, deixando sequelas nos pacientes.

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Foram analisadas amostras de líquido aspirado traqueal de 39 pessoas internadas com casos graves de Covid-19, intubadas em Unidades de Tratamento Intensivo (UTIs) da Santa Casa e do Hospital São Paulo, ambos em Ribeirão Preto, entre junho de 2020 e janeiro de 2021.

Também foram incluídos 13 voluntários críticos hospitalizados, mas por diferentes condições clínicas, para o grupo de controle, além de dados de proteoma de biópsias pulmonares de indivíduos falecidos em decorrência da doença.

“Descobrimos que as metaloproteinases agem por dois mecanismos no pulmão: por injúria tecidual e ao modular a imunossupressão por meio da liberação de mediadores inflamatórios existentes na membrana das células, como o sHLA-G, um importante mediador de resposta imune”, explica Carlos Arterio Sorgi, professor da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto, e um dos autores correspondentes do estudo.

A injúria é causada quando o tecido detecta um estímulo nocivo externo ou um corpo estranho. Nessas circunstâncias ocorre uma inflamação e, durante esse processo, o cenário se modifica com o surgimento de células de defesa produzindo mediadores que levam a um estresse oxidativo descontrolado.

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No campus da USP em Ribeirão Preto, Sorgi é um dos coordenadores do consórcio de pesquisa ImunoCovid, uma coalizão multidisciplinar de 11 pesquisadores da USP e da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) que trabalham em colaboração, compartilhando dados e amostras.

O consórcio, apoiado pela Fapesp, é liderado por Lúcia Helena Faccioli, professora da FCLRP-USP que também assina o artigo.

Além disso, o grupo contou com a participação da professora Raquel Fernanda Gerlach, da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto, especialista em metaloproteinases que divide a correspondência do artigo. “O consórcio buscou essa parceria para conseguir responder às perguntas mais complexas que apareceram neste caso”, conta Sorgi.

Resultados

Ao analisar as amostras, os pesquisadores detectaram que as taxas de MMP-2 e MMP-8 foram significativamente maiores no líquido aspirado traqueal de pacientes com Covid-19 em comparação aos não contaminados por Sars-Cov-2.

Além disso, os indivíduos que morreram tinham um nível maior dessas enzimas ativas do que os que sobreviveram.

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Durante a ação das metaloproteinases no pulmão são liberadas moléculas do sistema imune das membranas das células, entre elas sHLA-G e sTREM-1, responsáveis por causar imunossupressão no órgão. Ou seja, em vez de estimular a imunidade antiviral, o vírus acaba não enfrentando resistência do organismo.

Na pesquisa, os dados demonstraram que os níveis de sHLA-G e sTREM-1 eram elevados em pacientes com COVID-19 e, após uma série de testes, ficou demonstrado que a MMP-2 estava envolvida na liberação de sHLA-G.

+ LEIA TAMBÉM: E os remédios da Covid?

Em 2020, outro estudo do consórcio ImunoCovid havia apontado que o acompanhamento das taxas da proteína sTREM-1 no plasma, a partir dos primeiros sintomas, serviria como uma ferramenta importante para auxiliar na tomada de decisão das equipes de saúde e como um preditor de evolução e desfecho da Covid-19.

De acordo com os resultados publicados na Biomolecules, pacientes com a doença também apresentaram aumento na contagem de neutrófilos (um tipo de leucócito responsável pela defesa do organismo, capaz de produzir algumas metaloproteinases e espécies reativas de oxigênio) no pulmão.

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Embora a base molecular da imunopatologia do Sars-Cov 2 ainda seja desconhecida, está estabelecido que a infecção pulmonar se associa à hiperinflamação e ao dano tecidual. As MMPs são componentes cruciais dos processos que levam à pneumonia e ao agravamento dos casos da Covid-19.

Até então, as metaloproteinases vinham sendo estudadas como biomarcadores para a doença, como foi o caso de artigo publicado no ano passado por outra equipe de pesquisadores da USP de Ribeirão Preto na revista Biomedicine & Pharmacotherapy.

No trabalho divulgado agora, essas moléculas aparecem na patogênese do pulmão, como potencial alvo terapêutico.

Segundo Sorgi, a ideia é seguir os trabalhos testando em modelos animais um inibidor de metaloproteinase associado a anti-inflamatórios para tentar reverter o quadro grave de Covid-19.

Uma dessas drogas é a doxiciclina, antibiótico disponível no mercado brasileiro e atualmente usado para tratar doenças como febre tifoide e pneumonia.

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“Vamos precisar começar do zero. A ideia é montar um novo projeto, incluindo parcerias com grupos internacionais, para trabalhar com o modelo animal e depois a aplicação clínica”, afirma o professor.

*Este texto foi originalmente publicado por Agência Fapesp.

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