Em meio à pandemia de Covid-19, o número de brasileiros que morreram de apendicite aguda aumentou 14,2% em 2020 em comparação com 2019, segundo dados do portal Datasus, do Ministério da Saúde, tabulados pela Agência Einstein. Foram 879 óbitos no primeiro ano da pandemia ante 770 no ano anterior.
Na última década, o crescimento médio anual de mortes por essa causa foi de 2%. A alta atípica em 2020 pode estar associada à demora pela procura de auxílio médico durante o surto de coronavírus e à lotação dos hospitais durante os períodos de pico da pandemia, o que pode ter deixado pacientes com outras queixas de saúde sem atendimento.
“O que percebemos foi que houve um retardo geral na procura por ajuda médica em relação a uma série de doenças, com o agravante de que muitos pronto-atendimentos foram fechados para se tornar atendimento à Covid-19. Ou seja, além de o paciente demorar mais para buscar ajuda, também demorava para conseguir acesso ao atendimento, com hospitais superlotados por covid”, argumenta o médico Adonis Nasr, cirurgião do aparelho digestivo, professor de cirurgia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e coordenador de cirurgia do Hospital Universitário Cajuru, em Curitiba (PR).
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O que é a apendicite?
O apêndice é uma estrutura anatômica que representa um prolongamento do intestino. Por se tratar de um órgão linfoide (que produz células de defesa), acredita-se que um estímulo imunológico pode ocasionar o inchaço e demais eventos que caracterizam a doença, a apendicite.
De acordo com Nasr, o quadro inicial da doença é inespecífico, e o paciente pode sentir uma dor abdominal vaga, mal-estar e não ter vontade de comer (inapetência). “Geralmente, não mais que isso”, explica o especialista.
“Aos poucos, [os sintomas] se intensificam e geram dor mais intensa no quadrante inferior direito do abdome, levando à apresentação mais clássica da apendicite. Ou seja, podemos esperar dor na fossa ilíaca direita [uma das nove divisões da anatomia do abdome], associada a perda de apetite, náuseas, vômitos e febre baixa. A tendência é o agravamento, com piora local e declínio do quadro geral do paciente, que fica mais febril e mais taquicárdico [aumento na frequência cardíaca]”, detalha o cirurgião.
Antes da pandemia
Até a instalação da Covid-19, a grande maioria dos casos de apendicite, segundo o cirurgião, era resolvida em fase inicial, com a infecção localizada no apêndice, através de uma cirurgia relativamente simples, com alta hospitalar de 24 horas.
“Com a chegada da pandemia, passamos a pegar casos cada vez mais graves, já evoluídos para peritonite, quando houve a obstrução completa do apêndice e a sua perfuração”, afirma.
O especialista explica que o processo de obstrução é progressivo e, quando acontece, a resolução é muito mais complicada.
“A apendicite tratada a tempo, antes da perfuração, é feita com a retirada cirúrgica do apêndice, que exige um corte pequeno. Quando o paciente chega com um quadro de evolução sistêmica, eventualmente precisamos fazer uma incisão [corte] extensa, no meio do abdome, para limpar toda a cavidade. Não raramente, é necessária mais de uma cirurgia para lavar, o que faz com que a mortalidade seja muito maior nesses casos”.
Sinais de alerta
Como os sintomas iniciais da apendicite são também comuns a outras doenças, o paciente precisa ficar alerta à sua continuidade. Se não houver melhora e a dor se tornar cada vez mais intensa e localizada, este é o principal sinal de alerta.
“Pacientes com essa apresentação correspondem a metade dos casos. A outra metade tem sintomas atípicos que podem levar a um diagnóstico mais tardio, como um incômodo menor e até mesmo diarreia camuflando uma peritonite, por exemplo”, finaliza o médico.
Incidência
A apendicite é a emergência cirúrgica mais comum nos pronto-atendimentos dos hospitais em todo o mundo.
Tradicionalmente, a faixa etária mais comumente atingida é até os 30 anos de idade, com pico entre os seis e 20 anos. A incidência diminui com o tempo, mas pode acontecer com pessoas de qualquer idade.
Comparativo de mortes pela doença, no Brasil, entre 2011 e 2020
Mortes por apendicite aguda:
- 2011: 661
- 2012: 715
- 2013: 740
- 2014: 760
- 2015: 739
- 2016: 735
- 2017: 755
- 2018: 785
- 2019: 770
- 2020: 879
Fonte: Sistema de Informações de Mortalidade (SIM)/Datasus/Ministério da Saúde
*Esse texto foi publicado originalmente pela Agência Einstein.