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Médicos elegem avanços do ano no maior congresso sobre câncer do mundo

Convidamos especialistas da BP - A Beneficência Portuguesa de São Paulo a escolher os principais destaques da oncologia na conferência da ASCO em 2021

Por Da Redação
11 jun 2021, 13h38
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  • Todo ano, a Sociedade Americana de Oncologia Clínica traz um panteão de descobertas e inovações na prevenção, no diagnóstico e no tratamento do câncer em sua conferência ASCO Anual Meeting. Considerado o maior evento médico da área no planeta, o congresso teve sua segunda edição exclusivamente virtual devido à pandemia da Covid-19.

    O tema do encontro em 2021 foi “Fazer o melhor pelos pacientes que cuidamos”. Além de debater tendências e divulgar pesquisas inéditas, a conferência buscou abordar a necessidade de oferecer a melhor abordagem terapêutica ao paciente independentemente de sua condição e de onde ele está — questão que remete aos desafios do acesso a uma medicina de qualidade.

    Foram cerca de 2 500 trabalhos científicos apresentados e 2 400 publicados online. Como não é fácil navegar nesse mar de informações e novidades, pedimos ao time de oncologistas da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, uma das referências no tratamento do câncer no país, para eleger os principais avanços contra tumores de mama, próstata, pulmão, intestino etc. Confira, área a área, os destaques que podem fazer diferença na prática clínica e na qualidade de vida dos pacientes.

    Câncer de mama

    Por Debora Gagliato, Manoel Carlos de Azevedo e Antonio Carlos Buzaid

    Um dos principais estudos apresentados avaliou o uso de uma terapia-alvo, o olaparibe, na prevenção do retorno da doença em pacientes diagnosticadas com tumores de mama localizados e consideradas de alto risco para recidiva. A medicação foi testada em mulheres com mutação nos genes BRCA 1 ou 2, conhecidos por acarretar aumento do risco de câncer de mama e ovário.

    O olaparibe é um inibidor de uma enzima essencial no reparo do DNA conhecida pela sigla PARP. Ao bloquear essa enzima, a droga faz com que o dano no DNA da célula tumoral não consiga ser reparado, ocasionando, como consequência, a morte da célula cancerosa.

    O estudo, batizado de OlympiA, demonstrou que pacientes tratados com um ano de olaparibe tiveram menos recidiva ao longo do tempo em comparação com aquelas que receberam placebo. Os achados destacam a necessidade de testes genéticos para flagrar mutações do BRCA em mulheres com diagnóstico de câncer de mama em estágio inicial e alto risco de recidiva. Os resultados do exame podem, assim, ter um impacto nas decisões terapêuticas.

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    Outra pesquisa avaliou uma estratégia para maximizar a resposta do tratamento quimioterápico em portadoras de tumores de mama com superexpressão da proteína HER2. Sabemos que aproximadamente 15% das mulheres diagnosticadas com a doença possuem o subtipo denominado HER2+. Muitas delas devem receber o tratamento quimioterápico combinado a anticorpos monoclonais que bloqueiam a proteína HER2 antes da cirurgia definitiva na mama.

    Ocorre que a quimioterapia associada a essas medicações, caso do trastuzumabe e do pertuzumabe, tende a provocar muitos efeitos colaterais. Pois no trabalho divulgado na ASCO os investigadores avaliaram um regime de tratamento pré-operatório baseado apenas em anticorpos monoclonais ou em uma única droga quimioterápica (paclitaxel) combinada aos bloqueadores de HER2.

    O estudo evidenciou altas taxas de erradicação completa do tumor, principalmente em pacientes que receberam o agente quimioterápico citado aliado ao trastuzumabe e ao pertuzumabe. Estudos maiores estão em curso na Europa e nos Estados Unidos para demonstrar definitivamente a segurança dessa tática, que poderá poupar mulheres de regimes mais intensos de quimioterapia e seus efeitos colaterais.

    Por fim, tivemos avanços contra o câncer de mama avançado com expressão de receptor hormonal (RH+) sem amplificação de HER2 — sim, existem vários subtipos da doença. Atualmente, o tratamento endereçado a essas pacientes consiste na combinação de terapia hormonal com uma terapia-alvo que bloqueia a proliferação celular (a iCDK4/6). Essa combinação tem resultado num controle adequado da doença, com um bom perfil de tolerância para pacientes e a manutenção da qualidade de vida.

    Podemos dizer que a droga-alvo iCDK4/6 revolucionou o tratamento desse tipo de câncer em estágio avançado: observamos aumento na taxa de resposta, na sobrevida livre de progressão da doença e na expectativa de vida global das pacientes na comparação com a terapia hormonal isolada. E foi justamente isso que se demonstrou com a atualização de dois estudos exibidos no congresso. Eles constataram claramente que pacientes que receberam a terapia-alvo viveram mais do que aquelas que ficaram apenas com a terapia hormonal exclusiva.

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    Câncer de ovário e de útero

    Por Juliana Martins Pimenta, Graziela Zibetti Dal Molin e Luciana Lage Meija Zapata

    Estudos preliminares avaliando novas opções terapêuticas para tumores de ovário e endométrio (tecido que reveste o útero), incluindo imunoterapias e terapias-alvo específicas, mostraram resultados promissores na ASCO deste ano. Será preciso aguardar os dados de análises maiores para confirmar os achados iniciais.

    Pensando no câncer de endométrio, foi apresentada uma pesquisa sobre o papel do teste genético nesse contexto. O trabalho comprovou que cerca de 10% das pacientes com a doença apresentam alguma mutação genética. A descoberta reforça a importância de exames do tipo e do acompanhamento de uma equipe de oncogenética no percurso terapêutico.

    Em relação ao câncer de colo de útero, um estudo avaliou se, nas pacientes com a enfermidade mais avançada no momento do diagnóstico, faria sentido adicionar um regime de quimioterapia ao tratamento-padrão com químio e radioterapia para evitar recaídas. Infelizmente, não foram observados ganhos com essa adição. Nesse cenário, investigações com novas drogas, caso da imunoterapia, estão em andamento para resguardar as pacientes de futuras recidivas.

    Melanoma e sarcoma

    Por Rafael Schmerling

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    O melanoma é o câncer de pele com maior risco de disseminação pelo corpo e maior taxa de letalidade. Na ASCO 2021, vimos a atualização de estudos com a imunoterapia apontando que esse tratamento proporciona uma chance da ordem de 50% em manter os pacientes vivos em mais de seis anos de seguimento.

    Uma nova droga da família da imunoterapia, o relatlimabe, demonstrou que, se usada junto ao nivolumabe, oferece um importante ganho no controle da doença e com efeitos colaterais mais brandos no comparativo com outra dupla de imunoterápicos (ipilimumabe e nivolumabe).

    Nesse contexto, outra modalidade de imunoterapia está se consolidando: a terapia celular. Ela usa células de defesa do paciente submetidas a um processo biológico em laboratório que lhes permite, quando reinjetadas, reconhecer e combater melhor o tumor. O conceito não é novo, mas a perspectiva é que a estratégia tenha logísticas mais simples visando ampliar o acesso.

    Vimos dados promissores da terapia celular em melanoma avançado e um tipo de sarcoma chamado sinovial. Por falar em sarcoma, um grupo de tumores que pode afetar tecidos como músculos, tendões e cartilagens, os efeitos da imunoterapia começam a ser mapeados por estudos com alguns subtipos específicos da doença.

    Tumores de cabeça e pescoço

    Por Carina Abrahão e Lucas dos Santos

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    Nesse campo, um dos trabalhos mais destacados (e inclusive apresentado na principal sessão do congresso), analisou se a adição da imunoterapia à quimioterapia traria benefícios a pacientes com câncer de nasofaringe recorrente ou metastático (quando a doença se espalhou para outros lugares). E, de fato, os indivíduos que receberam a imunoterapia além da químio obtiveram maior tempo de controle da doença e sobrevivência.

    Um segundo estudo, com desenho semelhante, trouxe resultados similares. Ambos foram desenvolvidos no Sudeste Asiático com imunoterapias ainda não disponíveis no Ocidente. Os dados divulgados sinalizam que essas novas medicações têm potencial de mudar a prática clínica. Duas outras pesquisas, ainda no câncer de nasofaringe, indicaram que o acréscimo da quimioterapia oral após o tratamento definitivo com rádio e quimioterapia ajuda a reduzir o risco de recorrência da doença.

    Em relação ao câncer de tireoide, um novo tratamento via oral foi capaz de melhorar o controle de tumores refratários ao tratamento com iodo e que resistiram a uma terapia oral prévia. Ainda que tenha sido observado aumento nos eventos adversos, o trabalho tem o poder de mudar condutas de forma imediata, uma vez que essa droga já se encontra no Brasil.

    A imunoterapia também mostrou resultados promissores em pacientes com câncer nas glândulas salivares e naqueles com tumores de boca e garganta submetidos à cirurgia. Vai um tempo, porém, para que essa estratégia possa ser empregada em nosso dia a dia.

    Câncer de pulmão

    Por Suellen Nastri Castro e William Nassib William Junior

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    O câncer de pulmão é o tumor que mais mata no Brasil. Entre os subtipos da doença, o carcinoma de não pequenas células é aquele mais prevalente. Suas chances de cura aumentam quanto antes for diagnosticado. A cirurgia é a principal opção terapêutica nesses casos. Só que, mesmo com uma operação adequada, muitos pacientes sofrem com a volta da doença.

    O tratamento com quimioterapia, administrada antes ou depois da cirurgia, pode reduzir as chances de recidiva do câncer de pulmão. Porém, a quimioterapia beneficia somente uma parcela pequena de pacientes, ilustrando a necessidade de medicações mais eficazes.

    Pois no congresso da ASCO dois estudos revelaram avanços nesse sentido. A ideia testada foi acrescentar a imunoterapia à quimioterapia, uma tática consagrada em tumores de pulmão avançados e que, agora, prova-se bem-vinda na doença precoce. Os resultados obtidos demonstraram, pela primeira vez, a eficácia da imunoterapia no tratamento de carcinomas de não pequenas células no estágio inicial e têm o potencial de elevar as chances de cura nesses pacientes candidatos à cirurgia. Sim, isso pode representar um novo padrão de tratamento.

    Em relação ao câncer de pulmão avançado, o congresso trouxe boas notícias com novas terapias-alvo. Esse tipo de medicamento bloqueia moléculas específicas que estão hiperativas no organismo e conferem, às células tumorais, maior capacidade de se dividir e espalhar. A identificação dessas moléculas por meio de testes genéticos que avaliam mutações permite personalizar e aprimorar o tratamento.

    Trabalhos divulgados na ASCO mostraram efeitos positivos de uma nova medicação aprovada nos Estados Unidos que tem como alvo uma molécula frequentemente alterada no câncer de pulmão (a KRAS). Os achados abrem um novo horizonte para pacientes com tumores avançados com essa mutação, um cenário de difícil tratamento hoje.

    Tumores gastrointestinais

    Por Fabio Kater e Ricardo Carvalho

    A partir da ASCO 2021 fica claro que devemos incluir a imunoterapia no tratamento dos tumores de esôfago e estômago, seja no cenário de doença avançada, seja no pós-operatório. A atualização de um importante estudo reforçou o benefício da imunoterapia também no tratamento dos tumores de intestino avançado que apresentam uma alteração molecular específica (chamada de instabilidade de microssatélite). Esta alteração é rara e, infelizmente, a estratégia não funciona para quem não a apresenta.

    Ainda em tumores intestinais, o congresso reforçou o papel da biópsia líquida na individualização do tratamento, confirmando a tendência de usar esses exames para realizar uma medicina realmente personalizada.

    Em relação ao câncer de pâncreas, a novidade ficou para os pacientes que apresentam doença operável, isto é, sem metástase. Um estudo indicou que o tratamento com quimioterapia e radioterapia seguido de cirurgia pode oferecer maiores chances de cura para um grupo de específico de pacientes, em comparação com a estratégia que era recomendada até então (cirurgia seguida de quimioterapia).

    Câncer de rim e próstata

    Por Fabio A. B. Schutz,  Melissa Meirelles e Fernando Maluf

    A sessão plenária da ASCO, a mais importante do congresso, trouxe pesquisas que podem vir a modificar ou ampliar o tratamento do câncer de rim e de próstata. O estudo KeyNote-564 avaliou o uso preventivo da imunoterapia com a droga pembrolizumabe em pacientes com tumor de rim que realizaram a extração do câncer ou a retirada total de metástases. Ele concluiu que a tática foi capaz de diminuir de maneira significativa o risco de a doença voltar. É a primeira vez na história que uma estratégia se mostra eficaz na prevenção da recidiva dessa enfermidade.

    Já o estudo VISION botou à prova um remédio inovador com uma substância radioativa — trata-se do Lutécio-177 ligado à molécula de PSMA — no tratamento do câncer de próstata que já se disseminou. O fármaco é captado pelas células tumorais, que recebem uma radiação e acabam morrendo. O tratamento demonstrou melhora significativa no controle do câncer de próstata metastático previamente submetido a terapia hormonal e quimioterapia.

    Ambas as medicações devem ser rapidamente submetidas às agências regulatórias sanitárias (no Brasil representada pela Anvisa) para possível aprovação e liberação aos pacientes.

    Tumores do sistema nervoso

    Por Camilla Yamada

    Os destaques na ASCO foram as apresentações de terapias-alvo e imunoterapia para tumores do sistema nervoso central. Em relação aos cânceres primários, ou seja, aqueles que se iniciam no cérebro, os principais dados positivos foram o benefício dos inibidores de BRAF/MEK nos craniofaringiomas papilares, os inibidores de ALK nos neuroblastomas, além do uso do medicamento larotrectinibe em vários tipos de tumores cerebrais, com taxa de resposta de 30%.

    Nos meningiomas de grau 2 e 3, assistimos ao incremento de sobrevida em seis meses para pacientes tratados com uma medicação da classe dos inibidores da via do mTOR. Em relação aos gliomas, outro tipo de tumor cerebral, não foi demonstrado benefício no glioblastoma com a utilização de abemaciclibe e CC-115 que inibe a via mTOR e a associação de marizomibe ou olaparibe ao tratamento-padrão com temozolomida e radioterapia em gliomas de alto grau IDH mutados tampouco foi efetiva.

    Sem dúvida, os dados mais impactantes foram vistos em tumores secundários, também conhecidos como metástases cerebrais. Destaco os resultados da imunoterapia com radiocirurgia para o controle intracraniano em pacientes de câncer de pulmão; o benefício de terapias-alvo (trastuzumabe deruxtecan, tucatinibe e pirotinibe) no câncer de mama HER2 positivo e metástase cerebral, com taxas de resposta entre 47 e 74%; e o importante benefício da combinação de imunoterapia em pacientes com melanoma.

    Leucemia e linfoma

    Por Phillip Scheinberg

    Entre as principais novidades na área da onco-hematologia, ganha evidência a terapia celular com linfócitos T geneticamente modificados, técnica conhecida pela sigla CAR-T. Ela tem se mostrado eficaz no longo prazo tanto em pacientes com leucemias linfoides agudas como naqueles com linfomas.

    Já os anticorpos conhecidos como BiTE, que estimulam o sistema imune do paciente a atacar as células dos linfomas e do mieloma, apesar de estarem em estágios mais iniciais de investigação, vêm mostrando resultados bastante promissores em pacientes que não responderam a tratamentos prévios. No mieloma múltiplo, os tratamentos estão melhorando a ponto de nos sugerir que, no futuro, o transplante autólogo pode vir a ser substituído.

    Enquanto isso, as terapias-alvo que atacam especificamente as leucemias agudas estão se mostrando proveitosas tanto em uso isolado como em combinação com outros tratamentos. Na leucemia linfocítica crônica, por sua vez, vimos a apresentação de medicações que apresentam menos efeitos colaterais sem perder a eficácia e dados comprovando que tratamentos com tempo fixo de duração continuam a se mostrar viáveis.

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