A nova onda dos transplantes
Procedimentos voltam a crescer após a pandemia e inovam em técnicas
Segundo dados do Ministério da Saúde, entre janeiro e setembro de 2023, foram realizados 6,7 mil transplantes de órgãos em todo o Brasil — o recorde da última década. Recentemente, o apresentador Faustão por um transplante de rim.
“Estamos recuperando a capacidade de transplantar que já vinha crescendo e foi interrompida pela pandemia”, celebra Luciene Barbosa, da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO).
Na avaliação da médica, a melhora se deve à eficiência do sistema nacional de doação de órgãos, tecidos e células — o maior banco público do mundo. No entanto, ainda há muito a ser feito em relação à conscientização: quase metade das famílias recusa ser doadora.
Ainda assim, a ciência anda a passos largos e tem esbanjado inovações, incluindo o xenotransplante, ainda em caráter experimental.
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Útero
O Brasil tem um papel de destaque na história dos transplantes uterinos. Em 2016, médicos do Hospital das Clínicas de São Paulo realizaram o primeiro procedimento bem-sucedido da América Latina com doadora falecida. No ano seguinte, a paciente que recebeu o órgão deu à luz uma menina saudável.
“Esse foi o único transplante uterino feito no país, mas, em 2024, realizaremos mais dois procedimentos em mulheres com síndrome de Rokitansky, que nasceram sem o órgão”, diz Dani Ejzenberg, ginecologista do HC. A iniciativa é uma parceria com o Instituto Roki, que apoia pacientes com a condição.
Intestino
Uma menina de 13 meses diagnosticada com insuficiência intestinal foi a primeira pessoa do mundo a receber um transplante de intestino de um doador morto. O procedimento foi feito em 2022 pela equipe de um hospital universitário em Madri, na Espanha.
A médica Beatriz Gil, chefe da Organização Nacional de Transplantes da Espanha, definiu o procedimento como um “marco global”, capaz de beneficiar pacientes no mundo todo. À imprensa, os pais da bebê relataram que, logo após a cirurgia, ela ficou muito mais ativa e alegre.
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Laringe
Em setembro de 2023, médicos de um hospital em Lyon, na França, realizaram um raro transplante de laringe. A beneficiada pela técnica foi uma mulher de 49 anos que, por duas décadas, respirou apenas por traqueostomia e perdeu a capacidade de falar. Seu estado resultou de uma complicação após ser entubada em 1996.
O transplante (quarto caso no mundo em 25 anos) contou com uma equipe de 12 cirurgiões e durou 17 horas. A reabilitação da nova laringe deve durar até um ano e meio, mas a paciente já teve progressos na fala.
Olho
No fim do ano passado, cirurgiões da Universidade de Nova York (EUA) anunciaram o êxito do primeiro transplante de olho do mundo. Quem recebeu o órgão foi um homem de 43 anos, que teve boa parte do rosto desfigurada após sofrer um grave choque elétrico no trabalho.
A cirurgia, que também incluiu um transplante parcial de rosto, conectou o olho esquerdo doado a artérias capazes de nutri-lo, mas não chegou a devolver a visão ao paciente. “O maior desafio é a conexão com o nervo óptico”, avalia Luciene Barbosa, expert em transplante de córnea.
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Xenotransplante
Para diminuir ainda mais a fila de espera, cientistas investem no desenvolvimento de técnicas que viabilizam o uso seguro de órgãos de animais em humanos. No Brasil, o cirurgião Silvano Raia está à frente do Centro de Ciência para o Desenvolvimento em Xenotransplante, na USP, que visa fortalecer a pesquisa e angariar verba para o projeto pioneiro.
“Nossa equipe já criou linhagens suínas geneticamente modificadas para evitar a rejeição dos órgãos”, afirma o médico, que projeta o primeiro experimento clínico por aqui em três anos.