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As Olimpíadas deixaram os brasileiros menos sedentários?

Especialistas debatem se a realização de um megaevento esportivo como a Olimpíada do Rio de fato estimula a população brasileira a se tornar mais ativa

Por Karolina Bergamo
Atualizado em 30 out 2016, 12h30 - Publicado em 30 out 2016, 12h30
 (Foto: Bruno Marçal/)
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Desde que o Rio de Janeiro foi escolhido como sede da 31ª edição dos Jogos Olímpicos, em 2009, as autoridades não se cansam de discursar sobre as suas heranças positivas para a infra-estrutura, o turismo, a mobilidade urbana e a promoção de saúde. Mas será que uma competição desse porte fomenta um cotidiano mais ativo entre os cidadãos?

Bem, os números das últimas Olimpíadas sugerem que não. Apesar de ter como lema “Inspirar uma Geração”, a de Londres (2012) não alcançou seu objetivo inicial. Em 2005, quando a capital britânica foi escolhida para receber o evento, os organizadores estipularam uma meta ambiciosa: motivar 2 milhões de sedentários a se mexer ao menos 30 minutos por dia, três vezes na semana. Passados dois anos, baixaram o sarrafo para 1 milhão. E nem assim saíram vitoriosos. De 2005 a 2010, 123 mil ingleses se engajaram no projeto. No mesmo período, o número de inativos aumentou em quase 300 mil.

“Se você incentiva o esporte profissional, corre o risco de desestimular o amador”, avalia o médico Marcelo Demarzo, da Universidade Federal de São Paulo, que participou de uma pesquisa sobre o impacto da Olimpíada de Londres na taxa de atividade física da região. Segundo ele, o cidadão comum pode achar que não tem o talento nem o gás para se aventurar numa modalidade qualquer.

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Os dados ingleses não são os únicos a contrariar a tese do legado olímpico. Um estudo da Universidade de Sydney, na Austrália, constata que o tempo dedicado à malhação por adultos daquele país não mudou muito após os Jogos de 2000, sediados lá – passou de 295 minutos semanais em 1999 para 303 em 2000. Outro trabalho, esse da Universidade de Kent, na Inglaterra, revela que o índice de movimentação na Grécia subiu 6% um ano antes da Olimpíada de Atenas (2004). Cinco anos depois, porém, despencou para abaixo do nível de 2003. “Os atletas podem até servir como modelos. Mas um torneio, por si só, não gera mudanças de hábito”, afirma a educadora física Doralice de Souza, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), coautora do artigo Legados de Megaeventos Esportivos: Considerações a Partir de uma Perspectiva Crítica. “O chamado efeito inspiração, quando ocorre, não dura e tende a afetar quem já se exercita”, completa.

No longo prazo, essencial mesmo é ampliar a malha cicloviária, revitalizar áreas de lazer, melhorar a segurança pública, abrir academias populares, valorizar aulas de educação física… “O investimento deve ser feito de maneira permanente, e não apenas às vésperas de uma competição”, diz o educador físico Pedro Hallal, da Universidade Federal de Pelotas, no Rio Grande do Sul.

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Ficar entre os dez primeiros no quadro de medalhas. Esse foi o desejo do Comitê Olímpico Brasileiro (COB). Há quatro anos, a delegação nacional terminou em um modesto 22º lugar, com três ouros, cinco pratas e nove bronzes. E não é apenas no esporte profissional que o Brasil está longe do pódio. Segundo o Observatório Global de Atividade Física (GoPA, na sigla em inglês), 72% da nossa população se mexe com alguma regularidade, o que nos põe na 40ª colocação desse ranking.

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Por outro lado, não pense que ostentar um histórico olímpico dourado — sinal de investimento no esporte de alto rendimento — é sinônimo de um povo afeito a pedaladas e caminhadas. Os Estados Unidos, recordistas em medalhas, com 2 399 no total, ocupam o mísero 46º lugar na lista do GoPA. Já o Nepal, que participou de 11 Olimpíadas sem nunca subir ao pódio, é a nação mais ativa do globo, com taxa de 96%. Tanto que só 4,1% das mortes registradas lá decorrem do sedentarismo, ante 13,2% do Brasil.

Apesar dos pesares, será que a Rio 2016 encorajará os brasileiros a saírem do marasmo? Os especialistas têm suas dúvidas. O presidente do Confef, Jorge Steinhilber, lembra que, desde 2007, quando a capital fluminense sediou os Jogos Pan-Americanos, o Brasil está em evidência no cenário esportivo. De lá pra cá, recebeu a Copa das Confederações e a Copa do Mundo – e nem por isso vimos mudanças sólidas. “Às vezes, esses torneios têm um efeito contrário ao desejado. A Olimpíada pode estimular indivíduos ativos a migrarem para a frente da TV, enquanto tomam cerveja e comem pipoca”, pondera.

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Demarzo traz outra preocupação: episódios extraesportivos como o surto de zika, a queda da ciclovia na orla do Rio e até o conturbado momento político contribuiriam para a sensação de que a Cidade Maravilhosa não está pronta para hospedar os Jogos Olímpicos. Aí, em vez de se engajar na competição e talvez experimentar uma modalidade, o indivíduo pode pegar ojeriza dela. Nesse sentido, uma pesquisa do Datafolha indica que metade dos entrevistados é contra o evento e 63% acreditam que ele trará mais prejuízos do que vantagens.

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Mas o secretário municipal de Saúde do Rio de Janeiro, Daniel Soranz, segue otimista. Na sua opinião, os preparativos para a Olimpíada já aumentaram os níveis de atividade física no município. Ele cita o programa Academia Carioca da Saúde, que, desde sua criação, em 2009, beneficiou mais de 93 mil indivíduos. “Dos inscritos, 96% controlaram a pressão, 80% perderam peso e 17% pararam de tomar remédios”, contabiliza. Só cabe ressaltar que o projeto não foi inspirado na Olimpíada e funciona paralelamente a ela.

Infraestrutura para todos?

Terminada a Rio 2016, várias das instalações estão previstas para ser abertas ao público. Mas isso nem sempre ocorre. De acordo com o Índice dos Estádios do Mundo (2012), do pesquisador Jens Alm, do Instituto Dinamarquês de Estudos do Esporte, todo grande campeonato gera seus elefantes brancos. Ele analisou 75 arenas de 20 países erguidas entre 1996 e 2010 para sediar Copas do Mundo de futebol, Olimpíadas e por aí vai. Então concluiu que a maior parte foi abandonada ou é subutilizada. Qual a razão? Na maioria dos casos, elas almejavam satisfazer as demandas dos organizadores e não do povo.

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Vamos, então, às promessas dos governantes sobre o assunto: um pedaço do Complexo Esportivo de Deodoro, o segundo maior polo de competições dos Jogos, será transformado no Parque Radical, tornando-se a segunda maior área de lazer da cidade. Já a Arena Carioca 3, que integra o Parque Olímpico da Barra, vai virar o Ginásio Olímpico Experimental, uma escola com método de ensino voltado para a prática esportiva e que possuirá capacidade para 9 500 alunos. “Não basta motivar a população a fazer atividade física. É preciso criar condições, como facilitar o acesso às instalações e disponibilizar orientação profissional”, frisa Doralice. Só assim um estilo de vida mais saudável deixará de ser mera promessa de campanha para se transformar, de fato, num legado às futuras gerações.

Inspiração para achar seu esporte

A Olimpíada do Rio teve 42 modalidades. Entre elas, Jorge Steinhilber, presidente do Conselho Federal de Educação Física (Confef), indica o atletismo, a natação e o handebol para os cidadãos que querem abandonar o sofá. As três práticas não requerem tanta técnica, esforço ou preparo para começar. A educadora física Doralice de Souza, da UFPR, destaca que a opção deve dar prazer ao sujeito. Do contrário, ele irá engrossar a estatística de 60% de pessoas que desistem nos três primeiros meses.

…E campeões no dia a dia

Se a disputa é por índice de atividade física, não tem pra ninguém: o vencedor é o Nepal, com uma taxa de 96%, seguido de Moçambique (94%) e Tanzânia (93%). Juntos, os três países somam apenas quatro medalhas olímpicas. Contudo, nesses casos o alto nível de movimentação pode ser consequência da pobreza — associada a um menor acesso a carros, eletrodomésticos e outros confortos que promovem o sedentarismo.

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