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Tá na internet, tá na TV, tá nos livros... tá no nosso dia a dia. O jornalista André Bernardo mostra como fenômenos culturais e sociais mexem com a saúde — e vice-versa.
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Mario Sergio Cortella: “Quero mais vida. Mas não qualquer vida”

Em novo livro, o educador e filósofo defende que tão importante quanto o comprimento da vida é a sua largura

Por André Bernardo
Atualizado em 28 ago 2024, 14h54 - Publicado em 28 ago 2024, 10h39
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  • Todos os anos, na última semana de dezembro, o educador Mario Sergio Cortella segue dois rituais: o primeiro é passar sua agenda a limpo. Sim, uma agenda física, de papel, dessas que compramos em papelaria. A tarefa inclui copiar alguns números e rabiscar outros. “Não é uma simples cópia automática. É um ato de revisão de vida”, explica.

    O segundo é pegar uma folha em branco, fazer duas colunas e escrever, de um lado, “apesar de” e, do outro, “por causa de”. E, em seguida, fazer uma lista: casamento, trabalho… Por exemplo: continuo trabalhando “apesar de” e “por causa de”. “Quando somamos mais senões do que razões, é sinal de que algo precisa ser mudado”, pondera.

    “Uma vida com valor é aquela que você deseja, de fato, viver. E querer viver é aquilo que lhe dá razões”. São apenas duas das reflexões de Vivemos Mais! Vivemos Bem? Por uma Vida Plena (Papirus – Clique para comprar*).

    Diálogos que viram livro

    O livro nasceu de uma partilha de ideias entre a filósofa Terezinha Rios e Cortella. É dividido em onze capítulos, com títulos como “A ditadura do relógio e o valor do tempo”, “A vida só vale porque é finita” e “Idade e preconceito” são alguns deles.

    A obra tem ainda um glossário que abrange 63 citações, do grego Platão ao gaúcho Luiz Fernando Veríssimo, passando por outros pensadores, como o alemão Friedrich Nietzsche, o polonês Zygmunt Bauman e o italiano Domenico De Masi.

    Muitos dos livros de Cortella nasceram assim: de bate-papos. Um dos primeiros foi com o frade dominicano Frei Betto, Sobre a Esperança (Papirus – Clique para comprar*). Depois, vieram outros. Para citar alguns: com Monja Coen, Nem Anjos, Nem Demônios: A Humana Escolha Entre Virtudes e Vícios (Papirus*); com Marcelo Gleiser, O Tempo e a Vida (Record*), entre outros.

    Escrevendo sobre saúde e bem estar

     

    Cortella publicou, até o momento, 51 livros sobre filosofia, teologia e educação. O novo lançamento, Vivemos Mais! Vivemos Bem? Por uma Vida Plena, difere dos demais por tratar de saúde e bem-estar.

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    Entre outros temas, discute distanásia (“Quando há uma tentativa de prolongar artificialmente a vida de enfermos incuráveis”) e suicídio (“Como se trata de um ato que marca a ausência absoluta de razão, ele é muito sério”).

    “O suicídio, movido pela percepção de uma circunstância real ou imaginária que se mostre insuportável, é sempre motivo de perplexidade e desacordo, pois parece resultar de uma decisão não por completo necessária; o mesmo não se aplica ao suicídio assistido quando for o efeito de uma escolha consciente e apaziguadora, no lugar de desesperadora”, discorre Cortella.

    “Não tenho medo de morrer, mas de ter uma vida que, ao final, tenha sido banal e fútil. A morte não é uma ameaça e, sim, uma advertência sobre o risco da mediocridade”.

    +Leia também: A ciência da felicidade

    “Quero mais vida. Mas não qualquer vida”

    Nascido em Londrina, Mario Sergio Cortella completou 70 anos no dia 5 de março. “Tenho certeza de que o número de dias que tenho para viver é menor do que o de dias já vividos”, filosofa no capítulo quatro da nova obra.

    Na prática, o que muda com isso? Muitas coisas. A começar pelo fato de que Cortella se tornou um sujeito mais criterioso. Um exemplo? Não lê mais qualquer coisa. Antigamente, guardava os livros que lia. Hoje, distribui. “Não tenho mais tempo a perder”, resume. “Quero mais vida. Mas não qualquer vida”.

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    Entre outros cuidados, zela mais pela própria saúde. Gosta de fazer longas caminhadas e de cozinhar para a família — nessas horas, costuma ter boas ideias para novos livros. Em Vivemos Mais! Vivemos Bem?, o autor cita o pai, Antônio, que apresentou os primeiros sintomas de Alzheimer aos 54 anos, e a mãe, Emília, que morreu em 2022, aos 93 anos.

    Fala também da filha, Ana Carolina, que teve meningite, ainda na maternidade, com apenas cinco dias de vida. Na época, ele precisou esperar 72 longas horas para saber o resultado de um exame. “E aí eu me dei conta, pela primeira vez, que 72 horas são 72 horas. Se eu arrumasse um milhão, ainda teria de esperar aquele prazo que parecia interminável”.

    Ao longo de 128 páginas, Cortella explica a origem de muitas palavras e revela a diferença entre outras. Medo não é a mesma coisa que pânico, emprego é diferente de trabalho e ócio e vagabundagem não são sinônimos.

    Há uma diferença entre antigo e velho”, revela no capítulo oito. “A obra de Paulo Freire e o pensamento de Platão são antigos, mas não são velhos. Museu não é lugar para coisas velhas, é lugar para coisas antigas. O antigo tem valor. Já o velho é descartável, gasto, acabado”, disseca.

    +Leia também: Prescrições do editor: para aprender com os mestres

    “Morrer: que me importa? O diabo é deixar de viver”

    Contador de histórias, Cortella lembra do dia em que, enquanto secretário de Educação da cidade de São Paulo, visitou uma escola na Zona Leste da capital. “Uma escola sem muros e com um jardim muito bonito”, descreve.

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    Lá, encontrou um casal de idosos que, durante o dia, cuidava do jardim e, à noite, fazia o curso de alfabetização. Cada um tinha um sonho diferente. O dele, aos 91 anos, era ser engenheiro; o dela, aos 89, era ler livros.

    “Morrer: que me importa? O diabo é deixar de viver”, ensina Cortella, tomando emprestado os versos do poeta gaúcho Mário Quintana (1906-1994), que morreu com quase 88 anos. “‘Deixar de viver’ não significa morrer no sentido terminal. É levar uma vida superficial, banal, fútil”.

    Muitas de suas frases, como “Faça o teu melhor na condição que você tem, enquanto não tem condições melhores para fazer melhor ainda” ou “Na vida é preciso ter raízes, não âncoras. A raiz te alimenta, a âncora te imobiliza”, estão estampadas em canecas, camisetas e ecobags à venda em uma lojinha virtual.

    Além dos livros que escreve, Cortella grava o podcast A Grande Fúria do Mundo, ao lado do filho, o jornalista Pedro Mota Cortella, e dá palestras – até o fim do ano, tem eventos agendados em mais de dez cidades.

    Dia desses, em um aeroporto movimentado, um garoto de uns dez anos de idade se agarrou às suas pernas e pediu para tirar uma selfie. “Por que você gosta de mim?”, perguntou Cortella, espantado com a pouca idade dele. “Você fala coisas que eu não sei”, foi a resposta que ouviu.

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    “É assim que eu gostaria de ser lembrado daqui a 70 anos. Como o professor que falava coisas que as pessoas não sabiam”, orgulha-se, abrindo um sorriso largo.

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