De acordo com os dados mais recentes do Atlas de Diabetes da Federação Internacional de Diabetes (IDF, na sigla em inglês), existem 537 milhões de adultos com essa doença no mundo – cerca de 10% da população do planeta – e o Brasil está em quinto lugar neste ranking. Desse total, 95% apresentam o tipo 2 da doença, quadro mais comum em obesos acima dos 40 anos, quando não há dependência de insulina.
Nesse grande grupo reside a maior propensão a doenças cardiovasculares (DCVs), com até cinco vezes mais chance de ocorrência em comparação com quem não tem diabetes, o que leva a doença a ser considerada um dos maiores fatores de risco para problemas cardíacos.
Para ter ideia, as complicações cardiovasculares são responsáveis por 68% das mortes entre pessoas com diabetes acima de 65 anos. Infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca, acidente vascular cerebral (AVC) e doença arterial obstrutiva periférica são as principais causas de óbito.
Isso ocorre porque o diabetes melitus tipo 2 se caracteriza principalmente por uma combinação de resistência à ação da insulina e pela deficiência na produção desse hormônio, o que promove a elevação da glicemia. Esse processo pode levar a uma inflamação crônica das artérias, predispondo o organismo à aterosclerose.
Por isso, ao longo do mês de novembro, em virtude do Dia Mundial do Diabetes, celebrado neste 14 de novembro, a Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) promove uma campanha de conscientização para que as pessoas não negligenciem o tratamento da doença.
Estima-se que mais de 50% dos indivíduos com diabetes não tenham conhecimento da própria condição porque ela é silenciosa. Muitas vezes, a doença só dá pistas de que está fazendo estragos no organismo quando já está em estágio avançado, inclusive provocando comprometimento cardíaco. Não para menos, uma das maiores preocupações dos médicos ao tratar pacientes com diabetes é protegê-los de possíveis complicações do coração.
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Acertando o alvo
Nos últimos cinco anos, tivemos uma verdadeira revolução no tratamento dos pacientes com diabetes, com estudos relevantes que já trouxeram respostas práticas e comprovadas. Além do controle glicêmico, algumas classes de medicamentos contribuíram para a redução de mortalidade por razões cardiovasculares como por outros fatores.
Especificamente para as intercorrências cardiovasculares, destacam-se os inibidores dos cotransportadores de sódio e glicose do tipo 2 (ISGLT2) e os análogos do peptídeo semelhante a glucagon 1 (GLP-1).
Os ISGLT2 inibem a reabsorção de glicose pelo rim, favorecendo o controle glicêmico, independente da ação da insulina. Outros dois efeitos adicionais relevantes estão relacionados à ação diurética e, consequentemente, à redução dos níveis da pressão arterial e da perda de peso.
Já a classe dos análogos de GLP-1 é composta por drogas que mimetizam a ação das incretinas, que são os hormônios intestinais liberados em resposta à ingestão alimentar, importantes para o controle da glicemia. Eles estimulam a secreção de insulina, reduzem os níveis de glicemia, aumentam a saciedade, controlam o apetite e retardam o esvaziamento gástrico. Dessa forma, são drogas também eficazes e aprovadas para o tratamento da obesidade.
Os medicamentos que promovem proteção cardiovascular indo além do controle glicêmico e diminuindo parâmetros inflamatórios constituem um grande avanço no tratamento do diabetes, particularmente nas populações que colecionam fatores de risco ou mesmo com doença cardíaca estabelecida.
São dados que representam uma importante evolução no combate ao diabetes e suas consequências e é gratificante chegarmos aos 100 anos da descoberta da insulina, que revolucionou o tratamento da doença, com essas novas e promissoras possibilidades de tratamento.
*José Francisco Kerr Saraiva é assessor científico da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp) e foi presidente da entidade durante o biênio 2018/19.