O meu diagnóstico veio em 2017, mas os sintomas da esclerose múltipla começaram muito antes. A falta de informação sobre a doença e diagnósticos inconclusivos atrasaram muito esse processo.
Clique aqui para entrar em nosso canal no WhatsAppMinha primeira crise foi em 10 de junho de 2012, quando eu tive uma paralisia facial e fiquei alguns dias com metade do meu rosto completamente imóvel. Eu não procurei ajuda médica especializada e algumas sessões de fisioterapia, à época, “resolveram” (com muitas aspas) o problema.
A segunda foi em dezembro, com a perda parcial e temporária da visão. Por alguns dias, não enxerguei nada com o olho direito. Um vulto, breu completo. Procurei um oftalmologista, tomei alguns remédios e voltei a enxergar na semana seguinte.
Por quatro anos, a doença ficou adormecida e a minha vida continuou, até setembro de 2017, quando a terceira e a pior das crises — até então — aconteceu. Perdi novamente a visão, mas desta vez do olho esquerdo. Fui para uma emergência hospitalar e, depois de alguns exames, fui informada de que o meu problema era neurológico.
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Foram doze dias de internação. Entre ressonâncias magnéticas, coletas de sangue e muitas pulsões na lombar, recebi o diagnóstico. Era esclerose múltipla. Fui informada de que a doença não tem cura e afeta todo sistema motor.
Saí do hospital em negação. E em negação permaneci por muito tempo, para ser honesta — talvez eu ainda esteja, em alguns momentos. A esclerose múltipla e eu vivemos poucos altos e muitos baixos, o que compromete muito a saúde da nossa relação.
Uma ajudinha dos coreanos
Foi quando a banda de kpop BTS entrou na minha vida, em meados de 2019. Minha afilhada Laura me apresentou a banda. Eu nunca fui apaixonada ou uma fã de verdade de qualquer grupo musical, mas eu me encantei por todos quase que imediatamente. Os meninos — como nós, Armys, chamamos os integrantes da banda — viraram uma luz para os dias ruins.
As músicas me salvam nos dias mais difíceis, como aqueles em que permaneci internada por semanas em um hospital. A medicação intravenosa era a pior parte. Tenho algumas letras do BTS tatuadas pelo corpo, Life Goes On é a principal delas. A letra fala que “outro dia virá/ como se nada tivesse acontecido/ sim, a vida continua” e é isso que eu procurava pensar sempre que eu não aguentava mais.
Olhar para essa tatuagem me lembra que eu sou forte e de que vai passar.
Clique aqui para entrar em nosso canal no WhatsAppO que faz a diferença
Eu tenho sorte de nunca ter passado uma noite sozinha no hospital porque minha companheira, Ingrid, minha mãe, Beatriz, meu pai, Antenor, meu irmão, Rodrigo, minha irmã, Janaína, nunca deixaram.
Minha amiga, Vivian Leal, também nunca me abandonou, assim como muitos outros amigos — não vou conseguir listar todos, mas eles sabem quem são. Eu sei que, neste aspecto, tenho sorte. A amizade, inclusive, é mais um ensinamento que tive com “os meninos”.
Muitas pessoas não tiveram a assistência que eu tive e continuo tendo, ao longo dos anos, mas não posso dizer que é fácil. Eu não escolhi ter uma doença que destrói o meu sistema imunológico e, gradativamente, pode afetar a minha mobilidade, mas eu pude escolher (e trabalho isso mentalmente todos os dias) como lidar com ela.
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O diagnóstico de esclerose múltipla mudou tudo na minha vida. Eu não escolhi desencadear a doença aos 29 anos de idade, assim como não escolhi viver com ela hoje, aos 36.
A Tábata de antes não dava muita atenção para saúde, não pensava muito no amanhã e em como o hoje é importante. Do dia para noite, me vi obrigada a olhar para mim e repensar tudo aquilo que eu entendia como normal, como corriqueiro e entender que, a qualquer momento, eu posso entrar em crise e precisar, de novo, ser internada.
Cuidar de mim se tornou a minha principal obrigação. Esse cuidado, no entanto, não é linear. Honestamente, ainda não me sinto preparada para falar sobre a doença — e nem sei se um dia estarei. Sempre me surge um nó na garganta quando me perguntam sobre o assunto.
São 8 anos de diagnóstico e, de vez em quando, ainda brigo com Deus por causa da esclerose múltipla. Por que eu? O que eu fiz para merecer esse fardo? Não desejo mal para ninguém, mas não poderia ser com outro ao invés de mim?
Escrevendo esse texto, sinto como se todos os gatilhos tivessem sido desencadeados ao mesmo tempo porque, mais uma vez, sou obrigada a lembrar que com apenas 36 anos, tenho uma doença que não tem cura.
Não é fácil, mas a vida continua
Quem me enxerga externamente, quem vê a minha alegria nas redes sociais, as brincadeiras que faço com filtros e músicas, não imagina que eu tenho uma doença incurável e que, a longo prazo, isso pode limitar a minha vida drasticamente.
Para mim, é muito importante estar com as pessoas que amo, minha família, meus amigos e não abrir mão de pequenos momentos de prazer.
Recentemente, comecei a fazer exercícios e descobri outro lado de mim que desconhecia. Participei de uma prova de corrida, caminhando três quilômetros e foi a principal conquista até aqui.
A minha última internação foi em agosto de 2023 e, desde então, a doença está em remissão. Hoje, eu tenho consciência de que não sou uma pessoa doente, mas que tenho uma doença que precisa de cuidados e atenção. Eu realizo acompanhamento e tratamento diário, tomo medicamentos, faço terapia e outras medidas multidisciplinares para controle da doença.
Não é fácil olhar todos os dias para um estojo cheio de comprimidos e lembrar que a minha vida com qualidade depende deles. Mas tudo o que me cerca — família, amigos, música — me ajuda a seguir em frente.
*Tábata de Araújo é gestora de RH, tem 36 anos e é portadora de esclerose múltipla.