O Congresso Nacional tem a oportunidade de resolver um dos maiores problemas enfrentados por pessoas que recebem o diagnóstico de câncer: o medo da demissão após o período de afastamento do trabalho para tratar da saúde. É que a Câmara dos Deputados analisa projeto de lei já aprovado no Senado que pretende garantir estabilidade no emprego ao trabalhador que se afastar por auxílio-doença.
Atualmente, não existe lei que assegure essa proteção ao paciente com câncer. Quando muito, encontramos uma ou outra convenção coletiva que confere algum período de estabilidade a quem gozou do auxílio-doença. É a exceção da exceção.
Ainda existe o estigma de que o câncer torna o empregado inválido para o exercício do trabalho. Isso não é mais verdade. Diferentemente do que ocorria em um passado não tão distante, hoje, devido ao avanço da medicina, muitos tipos de câncer têm cura ou, no mínimo, podem ser controlados, com garantia de qualidade de vida e plena capacidade para o trabalho.
O indivíduo com câncer precisa ter a chance de provar que, após o tratamento, continua apto a desenvolver suas funções. Se houvesse uma fase de estabilidade ao retornar do auxílio-doença, a maioria dos pacientes conseguiria demonstrar sua capacidade. Já nos casos em que, infelizmente, não for mais possível seguir com as atividades profissionais, os benefícios previdenciários por incapacidade laboral devem ser preservados.
Enquanto a estabilidade no emprego ao paciente com câncer não é garantida por lei, o Tribunal Superior do Trabalho tem orientado juízes e tribunais trabalhistas a considerarem discriminatória a demissão de empregados com doença grave que suscite estigma ou preconceito. Dessa forma, caberá ao empregador provar que a decisão não teve nenhuma relação com a doença, mas, sim, com outras circunstâncias.
Configurada a discriminação, a justiça do trabalho poderá determinar a reintegração do trabalhador ou, quando não há mais clima para isso, condenar o empregador ao pagamento de uma indenização.
Em meio a discussões sobre as reformas trabalhista e previdenciária, um projeto de lei que trata da estabilidade de emprego para pacientes com câncer pode parecer de menor relevância, mas não o é para centenas de milhares de pessoas que recebem o diagnóstico da doença mais temida da nossa era. Debater (e atender) tal demanda é urgente.
*Tiago Farina Matos é diretor jurídico e coordenador do Núcleo de Advocacy do Instituto Oncoguia (SP) e autor do Manual dos Direitos do Paciente com Câncer