Se você tivesse que tomar uma decisão hoje que vai influenciar toda sua vida, o que escolheria: fumar e perder a voz para sempre ou largar o tabagismo? Parece um tanto radical, mas é, de certa forma, uma escolha que fazemos diariamente. E não apenas em relação ao tabaco quando tratamos dos riscos de desenvolver um câncer de cabeça e pescoço.
O tabagismo aumenta, em média, dez vezes a probabilidade de uma pessoa ter um tumor na cavidade oral quando comparada a quem não fuma. Para quem fuma e bebe, segundo a Sociedade Americana de Câncer, o risco chega a ser 30 vezes maior. Isso sem falar que o fumo é fator de risco para muitos outros tumores.
Os números realmente preocupam. De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (Inca), são esperados para o Brasil, no triênio de 2020 a 2022, 11 180 casos de tumor de cabeça e pescoço em homens e 4 010 em mulheres anualmente. O risco estimado é de cerca de dez casos novos a cada mil homens, o que deixa esse tumor em quinto lugar em incidência na população masculina. Entre as mulheres, são entre três e quatro casos a cada 100 mil.
Quando somados todos os tipos de cânceres da região da cabeça e pescoço, chegamos ao terceiro lugar geral em incidência pelos dados do Inca, com exceção do tumor de pele não melanoma. São ao redor de 40 mil casos por ano. Falamos de doenças que afetam boca, língua, gengiva, bochechas, amígdalas, faringe, laringe e seios paranasais, por exemplo.
O que faço para me proteger
A principal atitude para evitar esses tumores é ficar longe dos fatores de risco. Vale ressaltar que quando tratamos do fumo, envolvemos todo consumo de tabaco: cigarro, charuto, cachimbos, cigarros eletrônicos ou com aditivos, narguilé, vaper e até a maconha.
Além do tabagismo e do consumo excessivo de álcool, outras situações elevam a propensão ao problema. Uma delas é a má higiene bucal, assim como o uso de próteses dentárias mal ajustadas, largas, soltas ou apertadas, que levam a lesões na boca.
A infecção pelo papilomavírus humanos (HPV), que é transmitido pelo sexo oral sem proteção, está na lista dos fatores de risco, assim como a infecção pelo vírus Epstein-Barr (EBV), que pode causar a mononucleose infecciosa, transmitida pelo beijo.
Também aumentam a possibilidade de encarar um câncer de cabeça e pescoço a ingestão habitual de bebidas quentes — em especial aquelas servidas em alta temperatura, como o chimarrão —, a exposição excessiva ao sol, que ameaça os lábios, e o contato próximo, no ambiente de trabalho, com poeira de madeira, produtos têxteis, colas, pó de níquel, agrotóxicos, amianto, sílica, benzo e elementos radioativos.
Um dos desafios hoje é garantir o diagnóstico precoce desse conjunto de doenças. Ele faz muita diferença! Daí a importância de ficar atento aos sinais que podem indicar um desses tumores. Em geral, eles persistem por duas semanas ou mais:
- Feridas na boca ou no rosto que não cicatrizam
- Mancha avermelhada ou esbranquiçada na boca
- Dentes moles
- Mudança na voz ou rouquidão
- Dificuldade e dor ao mastigar ou engolir
- Caroços no pescoço
- Irritação constante na garganta
- Mau hálito frequente
Quanto mais cedo a doença é identificada e tratada, menores as chances de tratamentos invasivos e mutiladores.
Para evitar que as pessoas continuem perdendo a voz e a qualidade de vida para esses tumores, desenvolvemos a Campanha Nacional de Prevenção do Câncer de Cabeça e Pescoço, reforçada durante o Julho Verde. O slogan deste ano é “O câncer tá na cara, mas às vezes você não vê”.
Como constatamos pelos números, o câncer está no cigarro, no abuso de bebida alcoólica e na falta de cuidados com a saúde bucal. Precisamos dar mais visibilidade a essas doenças. Então, reflita sobre os seus hábitos e preste atenção aos sinais do seu corpo antes de ficar sem voz!
* Melissa A. R. Medeiros é sobrevivente de câncer de laringe, fundadora e presidente da Associação Brasileira de Câncer de Cabeça e Pescoço – ACBG Brasil