O Brasil é o país que mais realizou cirurgias de rinoplastia, de acordo com o último censo da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica Estética (ISAPS). Durante a pandemia, houve um aumento de 4 800% na demanda por esse tipo de procedimento. As pessoas passaram a se expor cada vez mais nas telas digitais e a notar insatisfações que antes passavam despercebidas. Ferramentas de busca online e maior tempo para pesquisar sobre o assunto também influenciaram a demanda.
No entanto, o interesse nem sempre é reflexo da necessidade real de operação, e o que pude perceber no meu atendimento foi um aumento do número de pacientes incertos que, repentinamente, optaram pela cirurgia com urgência desmedida.
O que as pessoas desconhecem é que a tela nem sempre expõe a realidade. Os celulares e as câmeras podem gerar uma distorção de até 40% da área em que se localiza o nariz. Assim, mesmo um nariz bem operado e proporcional, vai parecer alterado. Cria-se, então, uma sensação de frustração no paciente.
Com essa demanda expressiva e repentina por rinoplastia, fica evidente que o trabalho de cirurgia plástica da face não exige apenas um esforço de avaliação física, mas também uma análise cuidadosa da saúde mental de cada paciente.
Com 15 anos de experiência na área, identifiquei que aproximadamente 23% dos casos apresentam expectativa irreal durante a primeira consulta e, para a segurança dos pacientes, não indico o procedimento. Mas há aquelas pessoas que, por mais bem avaliadas que sejam, podem se sentir frustradas após a operação, a despeito do seu sucesso. Elas são incapazes de sentir a mudança ou o êxito da técnica.
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Percebendo essa dinâmica, optei por incorporar um sistema de avaliação em conjunto com um profissional da saúde mental e acolhimento psicológico em minha rotina. Em outras cirurgias catalisadoras de mudanças, como a lipoaspiração, a parceria entre médicos e psicólogos não é uma novidade. No entanto, na cirurgia plástica facial, principalmente na rinoplastia, esse é um trabalho recente.
O papel da equipe de psicólogos começa após a primeira consulta, provendo um acolhimento e balizando as expectativas. Eles avaliam se o paciente está preparado para realizar o procedimento e o orientam sobre a seriedade de cada etapa.
Esse momento é fundamental para definir se a cirurgia pode prosseguir, se será adiada ou cancelada. O paciente precisa entender quando não podemos operar e o motivo. Com os pacientes aptos, o acompanhamento segue mesmo após a intervenção, pois, em alguns casos, essa pessoa tende a procurar novos “defeitos”.
Esse tipo de serviço é uma demanda que passava despercebida no campo da rinoplastia e que vai exigir o esforço de profissionais interdisciplinares na transparência com o paciente em realizar a intervenção estética ou transmitir a real situação quando não houver tal necessidade. Os cuidados vão muito além da cirurgia em si.
* Mário Ferraz é otorrinolaringologista e cirurgião crânio-maxilo-facial e presidente da Academia Brasileira de Cirurgia Plástica da Face (ABCPF)