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Um raio x da pílula contra o câncer

A promessa de cura para todos os tipos da doença saiu do interior de São Paulo e se espalhou pelo Brasil. Descubra como funciona esse composto e porque ele vem gerando tanta polêmica | por Theo Ruprecht e Karolina Bergamo

Por Redação Saúde é Vital
Atualizado em 28 out 2016, 08h07 - Publicado em 10 dez 2015, 11h46
Deborah Maxx e Istock
Deborah Maxx e Istock (/)
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Mesmo sem ter sido estudada em seres humanos, a fosfoetanolamina move uma peregrinação de pacientes, com direito a campanha nas redes sociais. E a discussão em volta dela foi parar até em tribunais e no Congresso Nacional. O pai do composto, o químico Gilberto Chierice, e outros cientistas passaram a disponibilizá-la para as vítimas de câncer até 2014, quando a USP vetou a aplicação médica de quaisquer substâncias sem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa.

Após a decisão, surgiram vários pedidos de liminares, em boa parcela aceitos pelo Poder Judiciário, de pessoas que alegavam se beneficiar da pílula azul e branca. Isso tudo fez estourar um debate intenso. De um lado, vêm a cobrança e o desespero dos doentes, amplamente expostos nas redes sociais. Do outro, pesam as críticas dos especialistas, que exigem estudos controlados em seres humanos para comprovar o verdadeiro efeito da droga.

Como a fosfo funciona 
Pelo que se conhece até o momento, ela distinguiria as células sadias das cancerosas e, aí, sinalizaria para o sistema imune dar cabo delas. O fato é que, em bichos, a droga minimizou a proliferação das unidades defeituosas. Esses dados iniciais, junto com os testemunhos e as declarações de Chierice, alçaram-na ao status de cura para todos os tumores. “Mas isso é improvável. Ela até pode ser eficaz contra determinados tipos, mas cada câncer tem particularidades”, pondera o oncologista Rafael Schmerling do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes.

E não é que, do nada, a fosfo começou a ser distribuída a pessoas com câncer. Chierice e seu grupo revisaram a literatura científica, que desde 1936 associa a substância à doença. Eles também se desdobraram para sintetizá-la e, no começo dos anos 2000, publicaram investigações em culturas de células e roedores. Mas a história emperra aqui. Afinal, bons resultados em bichos não justificam o uso indiscriminado em gente. “Muitas vezes, a toxicidade observada em animais não é a mesma encontrada em seres humanos”, esclarece o farmacêutico Wagner Ricardo Montor, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. 

E os inúmeros relatos de melhora?
Eles impressionam até pela variedade de tumores que teriam sido rechaçados com a fosfo. Tanto que fizeram o advogado Dennis Cincinatus, do Rio de Janeiro, recorrer no Supremo Tribunal Federal (STF) de uma decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que impedia sua mãe, acometida por um câncer de pâncreas que não respondia a outras terapias, de receber a fórmula. O ministro do STF Edson Fachin concedeu a ela o direito de receber a pílula da USP. “Minha mãe tomava morfina de quatro em quatro horas. Agora não precisa mais e até consegue se levantar”, descreve Cincinatus.

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Só que, mesmo diante de tanto furor, é vital dar um passo atrás e compreender a razão pela qual a maioria dos cientistas insiste que relatos de caso, por mais empolgantes, não garantem a eficácia de uma droga.

Alguns motivos para ter cautela

  1. Os depoimentos positivos quase sempre se sobrepõem aos negativos. Várias pessoas que engolem uma pílula contra o câncer e não melhoram caem no silêncio ou, infelizmente, morrem antes de dar declarações. 
  2. Sempre há um viés por parte de quem coleta e seleciona os testemunhos. Ora, um sujeito que deseja provar o potencial de um comprimido pode destacar os finais felizes. 
  3. Sem um seguimento pormenorizado, é impossível medir a evolução do quadro (será que o tumor regrediu ou só alguns sintomas foram aliviados provisoriamente?). 
  4. Não dá pra saber se uma eventual recuperação veio da promessa testada, de um tratamento anterior ou de qualquer intervenção adotada, às vezes inconscientemente. 
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“Esses anos sem pesquisa clínica são um desperdício. Se a fosfoetanolamina é boa, perdemos tempo para aplicá-la em mais gente. Se é ruim, colocamos brasileiros em risco desnecessariamente”, comenta o oncologista Paulo Hoff, que dirige o Centro Oncológico do Hospital Sírio-Libanês. 

 

Que comecem os testes

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Foi anunciado que o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp) irá coordenar as primeiras pesquisas em seres humanos com a fosfoetanolamina sintética. Se tudo der certo,  teremos os primeiros resultados sobre a efetividade da molécula contra alguns tipos de tumor ainda em 2016. 

Mesmo assim, o Ministério da Saúde recomenda que as pessoas não tomem a substância até que todos os testes estejam concluídos. 

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