Se a estimativa dos médicos está mesmo correta, podemos dividir ao meio a população do planeta. Metade viverá em paz, não terá surpresas quando visitar o banheiro e não sentirá desconforto na reta final do aparelho digestivo. O restante irá encarar, alguma vez na vida, um problema que não mata, mas incomoda: as hemorroidas.
“A hemorroida nada mais é que a dilatação de um dos vasos sanguíneos do ânus”, define o cirurgião do aparelho digestivo Sidney Klajner, do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. “Ela pode ser comparada a varizes”, completa o proctologista Aloysio Almendra, do Hospital Copa DOr, no Rio de Janeiro. Uma veia resolve inchar bem ali e, ao inflamar e se deformar, é capaz de extravasar os limites anais. Aí surgem os sintomas, como sangramentos e dores ao evacuar.
A saída para o transtorno parece lógica: que se extirpem as hemorroidas! É a proposta da cirurgia tradicional, realizada há mais de 70 anos, que resolve o problema, mas cobra um preço: uma recuperação penosa, com direito a dores lancinantes. “Retiramos as hemorroidas por meio de cortes na borda do ânus, mas não damos pontos para evitar infecções”, resume Klajner. Diante da descrição, não é de estranhar a busca por soluções menos agressivas.
Conheça a THD
A dearterialização hemorroidária transanal guiada por doppler (ou, muito melhor, simplesmente THD) é uma alternativa. A ideia da terapia é japonesa, mas foi uma empresa italiana que a colocou em prática. Klajner, depois de um estágio em Roma, trouxe a técnica para o Brasil e já a empregou em 18 pacientes no Einstein. “Os resultados, até agora, são semelhantes aos da cirurgia convencional”, diz. Com uma enorme vantagem: “O paciente não sente dor após o procedimento porque, em vez de cortes, damos um nó no vaso problemático”.
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Antes de a THD aparecer, os especialistas já lançavam mão de outra terapia, popularmente chamada de grampeamento, como alternativa à cirurgia aberta. Ela consiste em recortar um trecho do canal do ânus e reunir as extremidades que sobraram. “O procedimento oferece menos dor, não requer cicatrizes externas e o paciente pode voltar para casa no dia seguinte”, diz o coloproctologista José Vinícius Cruz, professor da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre. Alguns estudos, contudo, alertam para possíveis complicações após a operação, como infecções.
A THD engrossa esse arsenal e, como seu foco de ação está em uma zona mais profunda do ânus, sem enervações para a dor, é mínima a chance do incômodo. A recuperação também acelera. “Em dois dias, o paciente já está trabalhando”, estima Klajner. O método, no entanto, não resolve todos os casos. “Ele deixa de ser recomendado quando há hemorroidas externas muito grandes”, diz. “A THD complementa o rol de opções terapêuticas, mas não representa uma panaceia”, acredita a coloproctologista Angelita Habr-Gama, professora de cirurgia da Universidade de São Paulo e médica do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, na capital paulista.
Tampouco ambiciona aposentar a cirurgia clássica. “As novas técnicas ainda são restritas devido ao seu alto custo”, observa Almendra. Outra questão que só o tempo poderá resolver é a validade da THD. “Apesar dos bons resultados, precisaremos de pelo menos 20 anos para saber se o tratamento se preservará por muito tempo”, pondera Klajner. De qualquer forma, se outra incursão ao hospital for necessária, o paciente fará o caminho muito mais calmo.
Sinais que costumam acusar uma hemorroida
Desconforto ao evacuar
Sangramentos que são denunciados por resíduos de sangue bem vermelho no papel higiênico e depois nas fezes. Com o tempo, podem aparecer pingos na privada
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Dores
Secreção
Coceira
Surgimento de um tecido anormal na borda do ânus na hora de evacuar e que pode recuar após o esforço
Prevenções
Embora os genes estejam envolvidos com a erupção do problema se há um caso na família, os riscos aumentam , alguns hábitos podem determinar seu aparecimento. “Um dos principais fatores é a constipação, que costuma ser resultado de uma alimentação pobre em fibras”, avisa o professor José Vinícius Cruz. “Outro erro bastante comum é não atender ao chamado da evacuação”, aponta. É como se fosse uma pena por não respeitar a vontade de fazer aquilo que ninguém pode fazer em nosso lugar.
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A popular prisão de ventre é parceira das hemorroidas por um motivo que tem tudo a ver com a privada. Na hora de defecar, o constipado costuma dispensar um esforço extra, que é nocivo aos vasos sanguíneos do ânus. Não à toa, gestantes e idosos, mais sujeitos a um intestino preguiçoso, são candidatos preferenciais a hemorroidas. Para se esquivar da cilada, estabeleça regras no cardápio. “A dieta deve ser rica em fibras, provenientes de frutas, verduras e cereais, e contar com muito líquido”, orienta o proctologista Marco Aurélio Perin, do Hospital Nossa Senhora de Lourdes, em São Paulo.
Outra medida que restringe a aparição das intrusas é a higiene após a evacuação. “É melhor limpar o ânus com água e evitar o papel higiênico, que pode machucar a região”, afirma o coloproctologista Marcelo Averbach, do Hospital Sírio-Libanês, também na capital paulista. E a atividade física? Você já ouviu por aí que ela provoca hemorroida? Esclarecemos o boato. “Os exercícios regulares costumam melhorar o funcionamento do intestino”, afirma Perin. Exagerar, no entanto, tem seu lado prejudicial porque o aumento da pressão no abdômen durante uma corrida, por exemplo, pode repercutir no ânus. Aí, para o azar do atleta, tanto suor será convertido numa ingrata hemorroida.
O fim do martírio
Entenda como a técnica conhecida pela sigla THD elimina as hemorróidas
1. O ânus é uma região altamente vascularizada. Alguns vasos dali podem se dilatar e deformar-se, causando desconforto e sangramento. A nova técnica acaba com as hemorroidas longe da borda do ânus, região mais sensível à dor. Para tanto, o paciente é anestesiado da cintura para baixo.
2. O médico introduz no ânus um equipamento dotado de um doppler, sistema que, por meio de ondas de som, detecta o vaso que origina a hemorroida ela tende a recuar com a entrada do aparelho. Dentro dele, há um espaço para manejar um porta-agulhas.
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3. Com esse instrumento, o especialista dá um nó no vaso problemático, que deixa de abastecer a hemorroida. Para arrematar o serviço, ela é aprisionada, com outro ponto, na porção do ânus sem enervações para a dor. A hemorroida some de vista e deixa de incomodar.
Os tipos de hemorroida
Os médicos costumam distinguir as hemorroidas em três categorias. Entenda a diferença entre elas
Interna
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A hemorroida se encontra no interior do canal do ânus, isto é, longe da sua borda. Por isso, a pessoa não a vê nem costuma sentir dor. No esforço de evacuar, porém, a superfície do vaso dilatado pode se romper e gerar um sangramento.
Externa
A hemorroida aparece, agora, na borda do ânus, tornando-se visível. As hemorragias e as dores são mais frequentes, uma vez que esse pedaço é extremamente sensível. Em algumas situações, pode-se formar um coágulo na região, aumentando o desconforto. Coceiras decorrentes de infecções também são mais comuns.
Prolapsada
Trata-se de uma hemorroida interna que, de vez em quando, consegue escapar e dar as caras o que acontece em geral quando o indivíduo está evacuando. Mas, após o esforço, ela tende a voltar para dentro naturalmente ou com alguma ajuda. Também pode incomodar ou sangrar.
Outras saídas
Tratamento clínico
Fazem parte desse grupo laxantes para melhorar o fluxo do intestino, pomadas de efeito analgésico e alguns remédios que coíbem a dilatação dos vasos. A missão é barrar a progressão das hemorroidas.
Procedimentos ambulatoriais
Entram na lista técnicas à base de laser, congelamento, infravermelho e soluções químicas que contêm a veia dilatada. Há também a ligadura elástica, que dispõe de anéis introduzidos no ânus para estrangular a hemorroida.
Grampeamento
Extrai-se um trecho do canal do ânus e, depois, se faz uma ligação entre as duas extremidades, encurtando a extensão da reta final do sistema digestivo. O procedimento reposiciona as hemorroidas de modo que elas não incomodem.
Cirurgia aberta
A técnica mais tradicional, a hemorroidectomia, opta pela remoção, via bisturi, das hemorroidas. Para afastar infecções, o médico não dá pontos nos locais abertos, cuja cicatrização pode demorar até um mês.
Mitos e verdades
Ficar sentado muito tempo no vaso sanitário favorece o transtorno?
Verdade. Livre-se daquele hábito de ir ao banheiro na companhia de uma revista ou de um livro. Ao ficar muito tempo sentado na privada, você força o ânus além da conta.
Hemorroida causa câncer?
Mito. A hemorroida não é capaz de se transformar em um tumor. Só preste atenção quando houver sangramento isso, sim, pode ser indício de um câncer no aparelho digestivo em vez de hemorroida.
Alimentos picantes aumentam o risco do problema?
Mito. No entanto, é melhor maneirar nas refeições carregadas de pimenta quando já existe uma hemorroida no pedaço. Isso porque elas podem desregular a digestão.
Sexo anal provoca o suplício?
Mito. Não há evidência de que essa modalidade sexual eleve o risco de uma hemorroida. O sexo anal provoca, na verdade, fissuras na região, que são outro problema.
Almofadas aliviam o problema?
Verdade. Mas, seja no sofá, seja no banco do carro, não passam de um paliativo. Muitos médicos nem recomendam o utensílio durante ou após o tratamento.
Prisão de ventre dá hemorroida?
Verdade. A constipação obriga o indivíduo a fazer mais força no momento de defecar. Daí, os vasos localizados no ânus tendem a se dilatar demais e, em alguns casos, podem se tornar visíveis.
Andar a cavalo ou de bicicleta contribui com as hemorroidas?
Verdade. Mas isso só acontece se o indivíduo passar boa parte do seu dia em cima da cela ou do selim. Para quem já tem o problema, recomenda-se evitar esses meios de transporte.
A gestação favorece a dilatação dos vasos?
Verdade. A pressão dentro do abdômen causada pela presença do bebê contribui com a retenção de sangue nas veias do ânus, que inflam e geram as hemorroidas. Para complicar, a gravidez costuma ser acompanhada de constipação. É hora de apontar o que procede e o que é mentira quando se fala em hemorroida